domingo, dezembro 30, 2007

DEZEMBRO - Prêmio Cooperifa, férias e...


Uh, Cooperifa! Uh, Cooperifa. Dezembro foi mês da loucura. Final de ano, fechamento de bimestre e aprovações na escola. Loucura, loucura. E mês de prêmio Cooperifa. Mais uma vez fui agraciado com este prêmio, mais do que especial, principalmente porque este ano recebemos o Don Quijote de la Perifa, mais conhecido como o homem de lata. Lindo, lindo. Tô olhando pra ele até agora.

Dia 15 de dezembro foi dia do último Chá na Concha, evento artístico-cultural-antimanicomial organizado pela Tânia e o pessoal dos NAPS, lá de Santos. Como sempre, muita música, pintura, literatura, loucuras e alegrias. Quem não foi, precisa conhecer...

NOVEMBRO - Semana de Arte Moderna da Periferia, Balada Literária, novas publicações.




"Não dá mais pra segurar... Explode coração." Novembro foi assim, altas emoções. A Semana de Arte Moderna da Periferia foi linda: artes plásticas, dança, literatura, teatro, música, cinema. Muita gente envolvida, suando, batalhando, trabalhando, curtindo; muita alegria, muito axé. Sem palavras, só quem estava lá pôde sentir.

Ainda tivemos a segunda edição da Balada Literária, organizada pelo Marcelino. Tive a felicidade de, na Balada, fazer a publicação de mais dois textos (contos). Um na antologia "MOSCAS", organizada pelo Marcelino e pelas Edições Dulcinéia Catadora, e o outro, o jornal "Menos Escritores", da Oficina também do Marcelino. No primeiro participei com o conto IDÉIA FIXA e, no segundo, com o conto MARIA.


MARIA

Eu não me importo de ter sido acusada de colocar cocaína na mamadeira com leite quente e farinha e não poder falar pra me defender quando o apresentador da TV me chama de animal monstro assassina buscando o melhor ângulo sobre o meu rosto quando o delegado me algema e me puxa pelos cabelos pra mostrar a minha cara chorosa e me chamar de fingida. Eu não me importo por ter sido trancada pela revolta das mães presas e por isso ter sido agredida justiçada surrada a cara marcada e ter uma caneta enfiada dentro da minha vagina. Revolta de mãe eu entendo. Eu não me importo com o laudo me inocentando depois de trinta e sete dias e o mesmo apresentador da TV se calando ignorando não pedindo desculpas fingindo desconhecer a notícia e a minha soltura na sexta-feira santa pra finalmente ver a pequena cova cheia em contraste com a minha alma vazia. Eu não me importo. Nada mais me importa. Nada.

OUTUBRO - Mês das crianças, dos professores...

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Um minuto de silêncio. Estamos de luto
Quem morreu?
A Educação.

No mês dos professores, publiquei um artigo no Correio Caros Amigos falando sobre o plano de metas da Secretaria de Educação. Uma homenagem póstuma a este defunto fatal para a nossa sociedade. Leia abaixo:


NO MEIO DO CAMINHO?

Você matricularia o seu filho numa Escola Pública do Estado de São Paulo? É uma pergunta que gostaria de fazer diretamente ao Governador José Serra, a atual Secretária Estadual da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro, e a todos os políticos de nosso Estado. Você, caro leitor, não tendo outra opção, matricularia?
A Educação Pública do Estado de São Paulo, no geral, é uma vergonha. Em alguns casos, criminosa. Pesquisas, indicadores comprovam. Da minha parte falo como alguém que está envolvido neste processo há quase vinte anos. Inicialmente como estudante. Hoje, como professor. O que vejo é algo que me deixa profundamente entristecido. Revoltado. Alunos passam pelas séries iniciais, chegam à 5ª, 6ª e 8ª série sem saber ler e escrever. São aprovados. Cursam o ensino médio com muita dificuldade. Aprendem pouco. E são aprovados. Alunos fazendo ciranda-cirandinha, perdendo tempo de estudos, buscando cadeiras e carteiras em salas pois não há número suficiente na sala em que se encontram. Outra opção seria sentar no chão. Ah, isso quando há salas. Quando estas não estão com goteiras, infiltrações, ameaça de queda de teto, curto-circuito, buracos. Muitas escola públicas estão em condições que se o CONTRU pudesse intervir, já as teria interditado. Não é boato. Há fotos e fatos. Muitas escolas não tem mais o antigo laboratório de ciências, que na minha época – veja, tenho apenas 26 anos – tinha. Muitas escolas não tem uma sala de informática, sequer computadores suficientes para a secretaria da escola e administração. As escolas têm alunos. Muitos. Que superlotam as salas e fazem qualquer professor que queira desenvolver um trabalho pedagógico eficiente e competente quase enlouquecer.
Mas por que eu digo tudo isso? Digo porque no dia 20 de agosto de 2007, o governador do Estado, acompanhado da Secretária de Educação lançaram um plano com “Dez metas para a Educação do Estado de São Paulo”. As “dez metas” - disponíveis no sítio http://www.educacao.sp.gov.br/ - deveriam ter sido amplamente divulgadas pela chamada “grande mídia”, afinal trata-se de uma “grande” mudança na Educação Pública do Estado. Não foram. Deveriam ser comemoradas por toda a população paulista, principalmente a comunidade escolar. Não foram. Muitos que ouvi consideraram um plano medíocre. Algo para inglês ver.
O plano parece ousado. Alguns pontos: “todos os alunos de oito anos plenamente alfabetizados, redução de 50% das taxas de reprovação da 8ª série e do Ensino Médio, laboratórios e computadores em 100% das escolas, aumento de 10% nos índices de desempenho do Ensino Fundamental e Médio nas avaliações nacionais e estaduais” entre outros. Só parece. Para mim, é um plano eleitoreiro, oportunista. Primeiro pois estabelece 10 metas para o ano de 2010. Apenas. Segundo, pois parece desconhecer muitas vezes a realidade escolar. Aliás, cabe uma pergunta: quantos pais, profissionais da educação, alunos foram ouvidos para a elaboração deste plano?
Enquanto professor, um dos principais problemas que encontro – além da falta de infraestrutura, suporte pedagógico, material, salário – é a superlotação das salas. Ter 35, 40, 42 alunos em sala não é ilegal, mas é anti-pedagógico. Entretanto, o Estado não considera isso um problema. Apesar da média da Avaliação do Ensino Fundamental (5ª à 8ª série) no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica no Estado divulgado este ano em Abril ter ficado em 4,5, quando o satisfatório seria 6. Apesar do município de Barra do Chapéu, no interior do mesmo Estado, ter ficado com uma média de 6,8, com a melhor quarta série do país, com uma média de 25 alunos por sala – em matéria da Folha Cotidiano, de 26 de Abril. Coincidência?
O Governo do Estado de São Paulo diz “todos os alunos de oito anos plenamente alfabetizados.” Concordo. Mas ele não diz o mais importante: Como? Será que um professor auxiliar nas primeiras séries iniciais é a solução dos problemas. Foi avaliado o motivo que leva alunos a completar o Ensino Fundamental, Ensino Médio sem saber ler e escrever? Responsabilidades foram assumidas? Por quem?
Outra coisa que me deixa indignado é a proposta “100% da escolas com laboratórios e salas de informática.” Ótima proposta. Entretanto, pergunto: as escolas públicas do estado nunca tiveram laboratórios, salas de informática. Respondo: sim, já tiveram. Os equipamentos foram deteriorados ou, principalmente, roubados. Culpa da comunidade escolar? Em partes, mas para mim o principal responsável ainda é o governo. Quando há invasões, arrombamentos, depredações, furtos ou roubos dentro da escola, raramente estes problemas são apurados, investigados. Outro fator é que a escola aparece como a solução mágica para todos os problemas da sociedade. Somente a escola não é. Não será. Além de investir, com planejamento e competência na escola, é necessário – sempre – ter os olhos para a Comunidade. Não apenas a comunidade escolar, mas a Comunidade como um todo. Pego como exemplo a região em que dou aula, Vila Cisper, Zona Leste de São Paulo. Os equipamentos de cultura e lazer – Teatros, Bibliotecas, Clubes – ficam, no mínimo, a meia hora de ônibus(!) do local da escola. Equipamentos de educação-não formal são raríssimos. As condições de moradia muitas vezes precárias. Esta comunidade não é exceção. Será que isso não influencia na relação desta com a escola? Na formação do aluno enquanto cidadão, enquanto ser humano?
Para mim, “As Dez metas para a Educação do Estado de São Paulo” é um plano fraco. Como disse, oportunista e eleitoreiro. Pois tem uma visão de Política Pública para a Educação limitada, apenas até 2010 – próxima eleição. A Educação não pode ser pensada, apenas, a curto prazo, de quatro em quatro anos. Claro, cada governante tem a sua marca, a sua personalidade, mas quando se fala em Políticas Públicas é preciso ir além do mandato. É preciso ir além do seu governo. É preciso ter uma visão de nação, de país.
Desde janeiro de 1995 quando então Mário Covas assumiu o Governo do Estado de São Paulo, o Partido da Social Democracia Brasileira é governo. Já passou Geraldo Alckmin, já se passaram doze anos. Este partido, que se auto-afirma muitas vezes como modelo em Gestão e Administração pública, não conseguiu construir uma Educação Pública eficiente no principal Estado econômico do país. Há 12 anos como governo, o PSDB poderia ter transformado totalmente a Educação em São Paulo. Não conseguiu. Um dos motivos aparece através das “Dez metas”: este é mais um Partido em que o governo se faz para os governantes. E só. Não para o povo, como a Democracia realmente precisa. E merece.

Rodrigo Ciríaco

SETEMBRO - Mês das Rosas



Setembro foi a vez do Allan da Rosa colar na minha escola. E foi bem bacana. Quarto encontro, os alunos fizeram livros, conversaram bastante. Aqui eles já estavam contaminados...

Setembro foi também o mês que nós lançamos a edição número 02 do jornal da nossa escola. Com um formato mais profissional, já que contamos com o apoios da minha amiga Juliana Kroeger para a diagramação.

AGOSTO - Entrelinhas, tudo pela Dinha...



Agosto também teve literatura. À convite da Lúcia, da Dulcinéia Catadora, participei de uma entrevista ao programa Entrelinhas, da TV Cultura. Bate-papo descontraído, na mercearia São Pedro, ao lado do Glauco Mattoso, Tião Nicomedes, entre outros cabras.

E, no terceiro encontro literário da escola, a Dinha. Um barrigão gigante, grávida de oito meses da Sara, esta guerreira honrou o seu compromisso, literalmente suando. Valeu amiga,

JULHO - Flip e Grande Sertão...


Eu nunca, nunca mais fui o mesmo. Depois que li Grande Sertão: Veredas, finalizado em julho, eu não sei mais o que sou. Senti um oco, um vazio. E estava feliz. Se ficar isolado numa ilha, já sabe o livro que eu quero levar.

E Julho foi o mês da Flip. Parati. Uma viagem gostosa, inesquecível. Eu, Tânia, Robson e Neide. Acampamento, praia do Jabaquara. Passeio de barco. Ô vida boa...

JUNHO - Só correria




Junho foi correria total. Prévia do que ainda estava por vir neste ano. Devido ao projeto de Literatura, fui convidado a participar da FLAP (indicado pela Dinha), na mesa A TURMA DO FUNDÃO: Literatura na Sala de aula, numa mesa de debate coordenada pelo tatu-bola Ivan Antunes.

Ainda em junho, peguei um bonde junto com a Cooperifa e participamos da Festa de Poesia de Dois Córregos, à convite de Frederico Barbosa. Lôco, muito lôco. Principalmente as brejas, a viagem no buzão. Ótimo pra todo mundo trocar uma idéia, se conhecer melhor.

E ainda teve a participação do Sacola na minha escola, o segundo escritor convidado. Pra variar, também deu zica, devido a desorganização da escola e, uma coisa muito, muito feia aconteceu. Virou conto. Leia abaixo e entenda:



SOCÁ PRA DENTRO

- Eu estava na escola, com um escritor convidado, quarenta alunos ao meu lado, e nenhuma sala. A sala reservada na semana anterior, que inclusive tinham limpado, lavado... Passaram pra outro.
- Desorganização total?
- Pois é. Aí me botaram na antiga sala da direção. Imagina, da direção! Uma salinha pequena, apertada. Eu, o escritor e mais quarenta alunos ali, espremidos. Eu lá consegui enxergar que tinha um interfone lá dentro, ligado diretamente na secretaria da escola e que os meninos tavam lá, toda hora apertando, fazendo barulho?
- E aí?
- Não, você não vai acreditar. Bateram na porta né? Toc, toc. Pois não? Professor, com que turma o senhor está? Ah, estou com várias. Da quinta à oitava série. São os alunos do projeto de Literatura. Posso dar um recadinho? Era a secretária da escola, toda educada. Mas é claro. Ela entrou, fechou a porta e perguntou, em alto e bom som:
- Pessoal, quem aqui tem hemorróida?
- O quê?
- Quem é que tem hemorróida?
- Não, cê tá brincando?
- Não, não tô. Na hora eu estranhei, até fiquei pensando: nossa, será que ela vai fazer divulgação igual aqueles cara que vem na escola, vender curso pra computação, vender passeio? Mas divulgação para hemorróida? Pomada?
- E aí?
- Aí que um aluno teve uma idéia genial né? Tia, o que é hemorróida? Rapaz, essa mulher começou a gritar: - Hemorróida é a porra dum caralho dum negócio que dá no meio do olho do cu, que dá uma coceirinha no dedo que faz vocês ficarem apertando essa merda de interfone. Dá pra parar ou eu vou ter que socá pra dentro? Bateu a porta plam! e saiu.
- Nossa véio, eu não acredito. Que rampeira! E os alunos, o que fizeram.
- Começaram a rir, não entenderam nada. Eu fiquei mudo, perdi a respiração, comecei a suar. Pedi mil desculpas pro escritor, falei que aquilo nunca tinha acontecido, e não tinha mesmo, pra ele entender.
- Nossa, que louco. Não dá pra acreditar. Já pensou se fosse um dirigente de ensino que tivesse ali dentro e ela fizesse isso? Ia dali pra roça, sem assunto. Ia rodar bonito.
- Mas foi justamente por isso. Ela sabia que era eu que estava lá, junto com um escritor. Que perigo que a gente representa? Em quem que a gente impõe respeito?
- Que barato sem noção...
- Não, e o pior foi a gozação, a molecada na escola depois. Qualquer coisinha, qualquer mancada que um aluno dava, alguém gritava: - Aí, vou socá pra dentro hein.

MAIO - Literatura (é) Possível



Quem disse que aluno não gosta de livro é bobo da cabeça ou doente do coração. Quem disse que a Literatura na escola de uma maneira prazerosa, didática, educativa e atrativa não é possível, não conhece a Cooperifa. Não conhece Marcelino, Dinha, Allan, Vaz entre tantos outros. Foi não acreditanto em todas essas afirmações que comecei o projeto Literatura (é) Possível, que promove encontros literários entre alunos e escritores da atual cena brasileira, na escola. Autores vivos! E a vitória foi a cobrança, no final do ano, para que o projeto continue. Que venham mais autores. Mas é claro que sim!!!

Marcelino foi a primeira cobaia do projeto. E enfrentou muitas dificuldades, uma escola caída, alunos com problemas para escrever. Uma realidade que eu me deparo, confronto e tento mudar, todos os dias.

Algo importante aconteceu a partir deste primeiro encontro, no dia 10 de maio. Marcelino fazendo um exercício de escrita e criação com os alunos, colocou uma frase no teco de lousa: "Deus é brasileiro." Um aluno ao meu lado, completou: - É, Deus é brasileiro. Mas quem manda é o Marcola. A partir disso, nasceu o meu primeiro conto, abaixo:



A.B.C.

Deus é brasileiro. Mas quem manda é o Marcola. É, ele é o patrão. Ah prussôr, eu não vou entrar não. Ele é quem manda. Tá bom, tá bom, já que senhor insiste. Mas ó, não vou fazer lição. Ah muleque doido! Tô cansado. Quatro da manhã ainda era noite jão. Só fazendo avião. Depois, o Play 2. Não é mole não. O jogo é bravo. Exige concentração. Que fita que eu tenho? Daquela de tiro. Plá, plá, plá. Me imagino tipo com uma 765. Mas logo mais eu tô com uma automática na mão. É, cê vai ver doidão.

Ah prussôr, não vou fazer lição não. Não entendo nada mesmo. Tô cansado de ficar só copiando. Num sei lê, num sei escreve. Contá? Contá eu conto, claro. Trabalho com dinheiro vivo. Se eu não conta quem é que garante a minha mesada? É, a vida é cara. Quem paga meu tênis, minhas roupa de marca? Quem? Pai e mãe num tenho. Já foi. Tudo morto. Só balaço. Mas eu nem ligo. Já cicatrizô. Nem choro. É rapá, homem não chora. Só Jesus chorou. O cara era gente fina, mas ó, muito pacífico. Comigo não, é na bala. Minha vida é na quebrada. E no esquema. Nem olhe pra minha cara. Olho, plá! Levô tiro.

Quem guia a minha mão é o Marcola. Se eu já matei? Eh prussôr, da missa cê não sabe o terço? Já tenho treze anos pô. Sô bicho solto, bicho feito. Tô enquadrado. É, já to viradasso. Já paguei até veneno. Um ano na FEBEM. Várias rebelião e o caralho. Tô aqui de L.A. Só por causa do juiz. Memo assim, num tem quem me segura. Fico pelos corredor, só nas fissura. Dando umas volta, ganhando a fita. Estudá? Só entro na aula do senhor porque o prussôr é gente fina. Mas não estudo não. E só entro de vez em quando. É não tem mais jeito jão. É feio ficar chorando pelo que se rebento, já se estrago. Tem defeito. Minha vida agora é assim, só no arrebento. Mudá? Só se for de ponto. De vida eu não quero não. Tô bem prussôr. Valeu a preocupação, satisfação.

Ah muleque doido! Ó, tô saindo. Cansei de ficar na sala de aula, na escola, sei lá. Aqui é tudo muito parado. Vou pra rua. Lá que é o barato. É. Lá eu já sou mestre.

ABRIL - "Me diz aí Tião..."




"Já que sou brasileiro e que o som do pandeiro é certeiro e tem direção..." Abril foi mês de aniversário de Suzano. E teve shows mais do que especiais com Zé de Riba, Edvaldo Santana e Lenine. Graças ao Sacola, ficamos numa área "Vip", bem pertinho do palco, curtindo um som MA-RA-VI-LHO-SO! Du caralho. Valeu Sacola.

MARÇO - Meninas super-poderosas



"Sonhar, mais um sonho possível." E são por eles que vale a pena permanecer, lutar. Transformar. E foi isso que fizemos. Através da idéia maravilhosa destas seis meninas, alunas de uma 6ª série, a Escola ganhou o seu primeiro jornal próprio: o FIQUE DE OLHO! Jornal dos Alunos e Alunas do Mesquita. Em 2007 foram três edições. Ano que vem tem mais...

FEVEREIRO - Escola




Do sonho à realidade. E que realidade. Uma escola pública em frangalhos, infiltrações, goteiras, risco de curto-circuito; lousas destruídas, professores e alunos desacreditados. Bem vindo à E.E. Jornalista Francisco Mesquita

JANEIRO - Lançamento SARAU


Comecei bem o ano, com a publicação do meu primeiro poema, em LIVRO. O poema OUTROS 500 saiu na Antologia SARAU, das edições Dulcinéia Catadora. Dia 27 de janeiro aconteceu o lançamento no SESC Pompéia, com a participação mais do que especias do Sales e do Canto.


OUTROS 500

O que chamam de descobrimento
Eu dou por invasão
O que chamam de conquista
Eu dou por destruição
O que chamam de encontro
Eu dou por extermínio
O que chamam de civilização
Eu dou por latrocínio
O que chamam de religião
Eu dou por uma desculpa
E o que chamam de tragédia
Eu dou por nossas vidas

Feliz Velho Ano Novo

car@s,

estas são as últimas postagens deste blog no ano de 2007. eu e tânia estamos em contagem regressiva para Recife, que nos aguarda a partir do dia 01 de janeiro, 20hs. ficaremos por lá até o dia 23 de janeiro! eita maravilha.

talvez eu atualize o blog de lá, com informações quentes - bem quente, rs - mas, não vou prometer nada. estarei de férias e, quero curtir.

quem precisar falar comigo, só em caso de urgência, estarei com o celular. só ligar.

e deixo aqui a minha retrospectiva deste ano que passou. apesar das dores, foi um ano de conquistas, avanços. obrigado aqueles que me ajudaram neste caminho. pra quem torceu contra, que receba em dobro tudo o que me desejou.

e é isto. boas festas.


rodrigo ciríaco

quinta-feira, dezembro 27, 2007

conto - APRENDIZ

Vagabunda não! Já lavei, já passei pra fora. Já ajudei minha mãe a fazê coxinha, bolinho de carne, esfiha. Agora tómo conta dos fio da tia Carla. E ela me paga, num é nada de graça não. Nem passa a mão nos meus peito eu dexei de graça pra esses muleque. Num sô otária. Tudo tem sem preço, né não? Eles até perguntaro: - E pá cumê? Me ofereceram dez real. Mas eu falei não, isso não. Isso aê só quando eu tivé di maió. Lá na quinta série.

terça-feira, dezembro 25, 2007

Poesia - Affonso Romano de Sant' Anna

EPPUR SI MUOVE

Não se pode calar um homem.
Tirem-lhe a voz, restará o nome.
Tirem-lhe o nome
e em nossa boca restará
a sua antiga fome...

Mente quem fala que quem cala consente.
Quem cala, às vezes, re-sente,
Por trás dos muros dos dentes
edifica-se um discurso transparente...

A ausência da voz
é, mesmo assim, um discurso.
É um rio vazio, cujas margens sem água
dão notícia de seu curso

Por isso que o silêncio
da consciência,
quando passa a ser ouvido
não é silêncio
- É estampido.

segunda-feira, dezembro 24, 2007

MIÚDOS MOÍDOS

Era uma vez...

E bem que podia. Mas não aqui.

Aqui, Alice não chega ao País das Maravilhas. Tem alma grossa, exagera no batom e se cobre com a pele do coelho estacionada numa rua Augusta chamada desejo.

Aqui, há poucas meninas doces e loiras, brancas como a neve.

Aqui, os meninos trocam bola por cola. Cachimbo não pertence ao Saci. Sucupira vende pedra pra fora da floresta e o Lobo Mau já devorou a mamãe, a vovó e algumas de suas próprias filhas.

Aqui, não tem Pokemón. Os cavaleiros não aparecem no Zodíaco. Peter Pan, Sininho e toda turma trabalham no farol e ainda não aprenderam a escrever o próprio nominho.

Aqui, Esqueceram de Mim é permanente. Campinho vira caixão. Homens à cavalo trazem espada e gostam de brincar de serra serra serra dor.

Aqui, só se pode contar com a astúcia. Não se seguem os bons. Harry Potter é adulto, usa vassoura e vive sumindo com cobertores e roupas num grande caminhão.

Aqui, Pequenos Príncipes vivem no mundo da lua. João e Maria fogem pra rua e devoram, avidamente, as migalhas do caminho.

Aqui, nóis não temos Educação. Negrinhos pastoreiam. Adeus Cinderela é golpe certeiro.

E todos vivem felizes para sempre.

COMANDO DA ELITE

- Licença pra falar, senhor?
- Licença concedida professor.
- Sabe o que é governador, temos dezesseis alunos na escola da quinta a oitava série que não estão alfabetizados. Mais uns outros que...
- E daí? Seja breve professor.
- Bom, nós não gostaríamos que eles fossem aprovados.
- Como assim? Que conspiração é esta? Quem não gostaria que eles fossem aprovados professor?
- Todo mundo da escola senhor: pais, alunos, professores...
- Absurdo! Isso está me cheirando a golpe. Estão querendo contrariar a lei professor?
- Não senhor.
- Nós temos um problema aqui professor?
- Não senhor governador.
- Então está tudo certo, tudo resolvido. Estão automaticamente aprovados.
- Mas senhor...
- E eu posso saber por que eles não foram alfabetizados?
- Situação difícil governador, o senhor sabe: muitos alunos em sala, muito trabalho; pouca gente séria, comprometida, pouca paciência. Além disso, não fomos preparados para alfabetizar alunos na quinta, sétima série e...
- Incompetência! Vai botar a culpa no governo agora professor?
- Não senhor.
- Então aprova logo esses moleque e pronto, depois a gente vê como resolve. Dispensado.
- Permissão para falar, senhor?
- Ai meu cace... Permissão concedida Aspira. Um minuto por favor.
- Nós já fizemos isso no ano passado senhor.
- Isso o quê?
- Deixar para o ano seguinte a alfabetização deste alunos.
- E por que porra não fizeram isso este ano, eu posso saber professor?
- Não autorizaram fazer uma sala de alfabetização com apenas dezesseis alunos senhor. O mínimo permitido em lei são vinte.
- Isso mesmo.
- Então...
- Então vocês não tiveram a capacidade de achar mais quatro analfabetos nessa merda de escola pra fechar uma turma?
- Ainda bem que não senhor. Além do mais, poderíamos ter formado uma turma com dezesseis, com dez, com cinco que fosse. Não importa o número, o importante seria alfabetizá-los, não?
- Insubordinado! Professor, o senhor é um fanfarrão! Quer contrariar a lei? Quer cometer uma improbidade? O senhor quer perder seu cargo, quer ser processado?
- Não senhor.
- Então pede pra sair. Pede pra sair!
- Eu quero sair senhor!
- Ah, muito fácil. Vai, vai embora. Vê se trabalha melhor e não traga suas frustrações aqui, no meu gabinete.
- Sim senhor, senhor.
- Muleque!

Desigualdade educacional no Brasil é ainda maior que a de renda

"Ah prussôr, tô cansado de ficar só copiando. Num sei lê, num sei escrevê..." (do meu conto, A.B.C.)

Reportagem da Folha (exclusivo para assinantes do jornal e do UOL) - EXCLUSIVO nada, leia abaixo - desta segunda-feira mostra que o abismo entre pobres e ricos no país em termos de educação é ainda maior do que o verificado na desigualdade de renda, área em que o país ainda figura como uma das nações mais desiguais.

De acordo com a Folha, o diagnóstico foi apontado por um estudo do pesquisador José Francisco Soares, coordenador do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da Universidade Federal de Minas Gerais, publicado no jornal científico "International Journal of Educational Research" (Jornal Internacional de Pesquisa Educacional).

O estudo estimou a desigualdade na educação brasileira usando a mesma fórmula aplicada pelos economistas para avaliar o grau de desigualdade na renda de um país. Esse índice varia de zero a um, sendo um o máximo de desigualdade, segundo a reportagem.

Soares usou essa escala e calculou a desigualdade de aprendizado de alunos brasileiros a partir das notas dos estudantes de oitava série nas provas de matemática do Saeb (exame federal de avaliação de aprendizagem) em 2003 (exame do MEC que avalia a qualidade da educação) e chegou ao índice de 0,635.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u357766.shtml


Desigualdade educacional é ainda maior que a de renda

Estudo mostra que abismo entre pobres e ricos no Brasil é maior na educação

Pesquisador usou parâmetros similares aos da fórmula usada por economistas para chegar a essa conclusão

ANTÔNIO GOIS DA SUCURSAL DO RIO

O abismo que separa pobres e ricos no país em termos de aprendizado é maior que o verificado na desigualdade de renda, área em que, apesar dos avanços recentes, o Brasil ainda é lembrado como uma das nações mais desiguais.A conclusão é de um estudo do pesquisador José Francisco Soares, coordenador do Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da Universidade Federal de Minas Gerais.Publicado no periódico científico "International Journal of Educational Research" (Jornal Internacional de Pesquisa Educacional), o trabalho estimou a desigualdade na educação brasileira usando parâmetros similares aos do índice de Gini, fórmula usada por economistas para avaliar o grau de desigualdade na renda de um país. Esse índice varia de zero a um, sendo um o máximo de desigualdade.Usando a mesma escala, Soares calculou a desigualdade de aprendizado de alunos brasileiros a partir das notas dos estudantes de oitava série nas provas de matemática do Saeb em 2003 (exame do MEC que avalia a qualidade da educação) e chegou ao índice de 0,635."É um valor alto, o que mostra que o resultado do sistema educacional brasileiro fica muito abaixo das expectativas. É também superior ao índice de Gini do Brasil, ou seja, a desigualdade educacional [...] é maior do que a econômica", afirma o pesquisador em seu artigo. Para 2003, o IBGE calculou em 0,545 o índice de Gini brasileiro.O estudo mostra ainda que a desigualdade entre meninas é maior do que a entre meninos e que, de 1995 a 2003, houve aumento no índice.Para calcular a desigualdade, Soares diz que os economistas estabeleceram como parâmetro uma situação ideal em que todos teriam a mesma renda e, a partir daí, medem quão distante cada país está disso. "O que fiz foi adaptar essa idéia para a educação. Aqui, entretanto, o ideal em termos de desempenho não é a igualdade. Não podemos querer que todos aprendam o mesmo em todas as áreas. Quando eu olho uma boa escola, é preciso que ela tenha um grupo de excelência, mas que seja também capaz de garantir níveis básicos de aprendizados para todos."Para Soares, o preocupante no caso brasileiro é que a desigualdade nas notas entre alunos nem sempre é discutida pelos gestores. Ele teme que possa acontecer com a educação o mesmo que ocorreu com a economia no milagre econômico (na década de 70) -ou seja, as médias crescerem sem que a desigualdade diminua."O Ideb [índice criado pelo MEC a partir das taxas de repetência e notas dos alunos para estabelecer metas de melhoria até 2022], por exemplo, não incorporou essa discussão. As médias poderão melhorar com estratégias não equitativas."Como exemplo de uma dessas estratégias que melhoram as médias sem diminuir a desigualdade, ele lembra que uma escola pode concentrar seus esforços nos alunos medianos e que estão mais próximos da meta, deixando de lado os que estão muito abaixo.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff2412200701.htm

P.S.: tá na hora da gente se ligá pra verdadeira revolução.

sobre o natal e o ano que não acabou

sim, eu sou mais um daqueles chatos que não gostam do natal. não gosto deste clima de festa, dos falsos abraços e sorrisos. não sou cristão suficiente para perdoar a todos e a todos os erros do ano por um único dia. nem os meus. natal sempre me pareceu uma data muito sofrida. não para mim, graças aos meus pais nunca faltou nada, nem ceia farta nem presentes. mas sempre me incomodou ver os outros, os que não tinham. eles me doíam.

como me dói ver a corrupção da data natalina. quem é mais importante, cristo ou papai noel? bem, veja os comerciais da coca-cola, o sorriso nos rostos dos comerciantes. o talão de dívidas dos trabalhadores. então, não me diga para ficar feliz com o natal.

nem com o ano novo. para mim o ano não acabou. não ainda. e nem acabará na próxima semana, depois da tradicional virada. sexta-feira foi o meu último dia na escola mas eu senti que não tinha feita direito a matéria. ela não estava completa. não poderíamos dizer que o ano havia chegado ao fim então. dos 26 (vinte e seis) alunos que estavam nas 5ªs, 6ªs e 7ªs séries, sem saber ler e escrever, apenas dois aprenderam. precariamente.

tod@s foram aprovados. ano que vem 6ª, 7ª e 8ª, sem aprender a ler e escrever.

não acho que deveriam ser "penalizados", repetindo. mas não acho que deveriam ter sido aprovados, pela falta de interesse de alguns, pela nossa total incompetência. vendo o ano letivo terminar, estes alunos terem passado um ano comigo e serem aprovados, sem saberem ler e escrever me fazem me sentir um incompetente. eu até que tentei ajudá-lo, mostrei-lhes o ABC, ajudei a juntar letras, formar sílabas, palavras, mas... não foi suficiente. eu não sei alfabetizar - ainda -, e por mais que consultava cartilhas, revistas especializadas, dicas, parava sobre as minhas limitações. me sentia impotente, frustrado e inútil.

como ainda me sinto.

o ano que vem a guerra continua. espero ter fôlego, convicção, paciência e esperança para lutar contra as minhas limitações, os meus medos. a minha insegurança. espero ter força, apoio e persistência para prosseguir. espero poder contar com a ajuda, de quem quer que seja e leia esta postagem. afinal, se você sabe disso que eu comentei aqui e lhe incomoda, você também pode fazer algo. deve sentir-se tão responsável - para mudar - quanto eu.

não beba muito por esses dias, não fale e não faça bobagens, ao extremo. um pouco é necessário para manter a lucidez.

e não esqueça que o mais importante é abraçar aquelas pessoas que a gente gosta, a nossa família. ainda que não tenha comprado nenhum presente.

e chega que daqui a pouco eu vou contradizer tudo que eu disse.

"Eu prefiro ser, essa metamorfose ambulante..."


Rodrigo

sábado, dezembro 15, 2007

PRA PUTA QUE PARIU

As ruas não foram feitas para as pessoas
As ruas foram feitas para os carros
A sociedade do automóvel
E seus infinitos carros
Parados
A espera do colapso.

As calçadas não são vias públicas
As calçadas não são vias privadas
As calçadas não são das ongs

A quem pertencem as calçadas do Brasil?

Alguns homens, ditos sérios
sem nenhuma hipocrisia, já me disseram
que os moradores de rua
adultos, crianças, cachorros e mulheres
estão privatizando calçadas

Atrapalham o trânsito e o pedestre
Obrigando-os todos os dias
a desviar os olhos.

E eu continuo me perguntando:
Se os moradores de rua
não moram nas ruas
Por que continuamos a
Ignorar este colapso social
em nossas calçadas ?

Porque continuamos a pensar
Que varrer uma pessoa
É a solução mágica?

Por que continuamos a fazer
Como ontem
Há dezoito meses
Há sete anos
Mais de cem anos

A Limpeza
E o esconderijo dos verdadeiros porcos da cidade
A Limpeza
Dos vidros dos prédios e dos olhos cinzas da cidade
A Limpeza
Da santa Sé e sua Igreja, praça da cidade
A praça que é(ra) do Povo

Se os moradores de rua
não podem viver nas ruas, calçadas, marquises
E não há espaços em nossas casas, condomínios fechados,
apartamentos de luxo
onde os enfiaremos?

Abro o jornal e descubro
o que pensa o dono da banca de feira,
o aposentado, o agente imobiliário e o prefeito:

É preciso retirar as pessoas das ruas
As ruas foram feitas para carros
Para as compras, na 25 de março
do 25 de dezembro, do 1º de Abril.

É preciso levar estas pessoas para Albergues
para que ninguém os veja
Coagi-los para Asilos,
Hospitais Psiquiátricos, o Canil
para que ninguém os sinta
Coagi-los para o lixo
os sete palmos das terras clandestinas de Perus
Para longe do sonho
que é o Brasil.

Só não os mandem pra puta que pariu!

A sociedade de consumo
Não aceita devolução
de produto.

Prefeitura tira 200 sem-teto da Praça da Sé

Moradores de rua entraram em conflito com agentes; eles foram encaminhados a albergues
Marcelo Valletta

Na quarta-feira e ontem, 200 moradores de rua foram retirados da Praça da Sé pela Guarda Civil Metropolitana (GCM) e encaminhados a albergues da Prefeitura. Houve confronto na manhã de ontem - quando sem-teto atiraram pedras nos GCMs -, mas ninguém foi preso.De acordo com o secretário-geral do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe), Ariel de Castro Alves, a ação configura crime, abuso de poder e constrangimento ilegal. 'Mostra que a Prefeitura assume que está fazendo limpeza social. O Condepe vai pedir explicações ao prefeito. Queremos saber quais programas sociais estão sendo colocados à disposição da população de rua. Ninguém pode ter cerceado seu direito de ir, de vir e de ficar', afirmou. A reportagem não conseguiu falar com representantes da Prefeitura e da GCM.'Feia' foi a palavra usada, sem pestanejar, pelo jornaleiro Paulo Claudino, de 60 anos, para descrever a situação da Sé, onde trabalha há 13 anos, de frente para a Catedral e para o Metrô. 'Hoje está limpinha, porque passaram aí levando o pessoal, mas depois volta a mesma coisa de sempre. Deveriam continuar essa limpeza todos os dias - e não apenas com a varrição. Porque eles chegam aí e vão ficando', afirma.O metalúrgico aposentado José de Paula Ferreira, de 81 anos, lamenta não poder mais andar pela praça com sua máquina fotográfica, com a qual alimenta seu hobby de registrar a arquitetura da capital. 'Deveria ser uma bela praça para se passear, mas hoje as pessoas têm medo. O centro da cidade deveria ser um marco. Acho que há tentativas de melhorar, de tirar os mendigos e os marginais, mas parece que sempre há um obstáculo. Cabe à Prefeitura deixar tudo aprazível e atrair turistas', cobra

sexta-feira, dezembro 14, 2007

Antes tarde do que nunca

Pois é, foi nunca. Não tarde. Nunca. Nunca porque, pelo menos isto, não dá mais. Não é possível. E como demorou, como eu trampei junto com os meus alunos pra fazer um negócio legal, por acreditar no sonho. Mas sonho é sonho, a realidade é mais cruel. Nem tudo é possível.

Vou contar para tentar entender.

Tudo começou quando escrevi um projeto para a escola chamado A Sedução da Palavra. Projeto de incentivo a leitura e produção escrita dos alunos. Mais do que isso. Esse é o nome burocrático. Na verdade é um projeto de amor à palavra, a literatura - como arte. A Sedução da Palavra engloba dois projetos que fiz na escola este ano: o Literatura (é) Possível e o FIQUE DE OLHO!, publicação dos alunos e alunas da EE Jorn. Francisco Mesquita.

A CENP (Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas) sempre abre editais para inscrições de projetos de complementação curricular, apoiando financeiramente os mesmos. Eu não sabia a roubada que era, pois bem, vou inscrever ambos os projetos que toco na escola. E já começou a burocracia.

Primeiro fiquei sabendo que não poderia usar o dinheiro para adquirir material "de uso permanente": não poderia comprar livros, não poderia comprar um computador, gravador, lápis e papel, tão necessários a ambos os projetos - literatura e jornal;

Segundo: não poderia pagar pessoas para oficinas, palestras, ou seja: se quisesse continuar chamando os escritores para ir na escola, chamar um jornalista para fazer uma oficina, um fotógrafo para dar uns toques nos meus alunos, teria que tirar do meu bolso, já que o projeto não cobre estes custos - as pessoas teriam que apresentar uma nota fiscal;

Terceiro: recebendo a verba, teria apenas 30 dias (trinta dias!) para usar toda. Resumindo: peço verba para imprimir um jornal trimestral, ou para fazer qualquer parada numa programação de dois, três meses, não posso. Você tem trinta dias para gastar o dinheiro.

Ainda assim eu entrei nessa roubada. Realmente, não poderia dar certo.

A última data para entrega dos projetos foi no dia 12 de julho de 2007.

No projeto, fiz o seguinte pedido:

- Dez ônibus para levar 448 alunos do Ensino Fundamental, Ciclo II - 5ªs à 8ªs séries - ao Museu da Língua Portuguesa;
- Um ônibus para levar os poetas da COOPERIFA para a escola;
- 18.000 cópias para impressão de 1.500 unidades do jornal da escola, Edição 02 e 03, para ser distribuída gratuitamente para @s alun@s da escola.

Eles encerram a data no meio do ano letivo. Pensei que seriam rápidos na indicação dos aprovados, afinal um ano tem apenas 12 meses - sei que isso é óbvio mas, os absurdos são tamanhos que algumas obviedades não são tão óbvias -, estávamos na metade do ano, não poderia demorar muito. Gastaríamos quando, nas férias?

Quase.

Passou julho, chegou agosto. Passou agosto, chegou setembro. Passou setembro, chegou outubro e nada. Quase três meses depois, nenhuma notícia sobre a aprovação do projeto. Já havíamos desencanado de imprimir as 1.500 unidades da edição 02 do jornal para distribuir de graça. Ele estava pronto desde setembro, não podíamos esperar mais. Imprimimos a edição 02 e desencanamos.

Dia 22 de outubro de 2007, três meses e dez dias depois da entrega do projeto e dois meses para o término do ano letivo, soubemos que o projeto havia sido escolhido pela CENP, entre diversos outros.

Apesar do tempo, nos sentimos honrados. Eu e os alunos ficamos felizes, agora era trabalhar. Comecei a agendar as visitas ao museu, tentamos organizar a vinda da Cooperifa na escola, a edição do jornal para ser impressa. Fomos trabalhando.

Metade do projeto deu certo. Mais ou menos.

Conseguimos levar os alunos no Museu da Língua Portuguesa. Dez ônibus. O problema é que, como o projeto só foi aprovado em outubro, só conseguimos marcar o museu no dia 01 de novembro - data indicada para os agendamentos - para... Dezembro. Você, caro navegante que conhece escola pública, fica aluno na escola, regularmente, no mês de dezembro?

Pois bem, conseguimos organizar as excursões, tudo muito tumultuado, amontoado, para garantir que os alunos iriam. Foi ruim mas foi bom. Conseguimos. Como o mês de novembro teve a Semana de Arte Moderna da Periferia, depois os eventos do Dia da Consciência Negra, não foi possível organizar a Cooperifa vindo na escola. Então, levamos os alunos do projeto de Literatura para a Cooperifa. Isto foi bom, foi ótimo.

Agora, faltava o jornal.

Eu e a tchurminha do jornal trabalhamos duro. Mesmo. Eu perdi mais de duas manhãs e duas tardes inteiras na escola, trabalhando como volunotário, organizando o fechamento junto com os meus alunos. Perdi mais algumas horas organizando o material para mandar para a minha amiga Jú, que faz a diagramação, tudo para ficar lindo. Bom, dia 06 de dezembro o jornal estava pronto. Faltava só o mais fácil: o dinheiro para imprimir.

Dia 06 ainda não estava liberado. Chegou dia 07, chegou dia 10 (de dezembro). Chegou dia 11, dia 12, dia 13 e nada. Cadê a liberação do cheque para imprimir o jornal? Cadê os alunos. Para quem eu iria fazer a distribuição de 1.500 unidades de um jornal da escola. Não posso deixar para o próximo ano, tem mensagens de natal. E aí? O que fazer?

Foi quando hoje, as 14:00hs eu recebi o cheque em mãos. R$ 1.260,00 (hum mil e duzentos e sessenta reais), para fazer as dezoito mil cópias das 1.500 unidades do jornal. E um detalhe. EU TINHA HOJE PARA GASTAR, fazer as cópias com este dinheiro. SÓ HOJE. Fiquei sabendo que o valor fora depositado na conta dia 14 de novembro. Contando a partir daí, trinta dias para gastar (lembra?). Hoje era o último dia. Outro detalhe: a empresa que fosse fazer a fotocópia tinha que fazer o recolhimento de 11% de INSS, em uma GPS. Não entendi muito bem mas, fui para casa para fazer a cópia do jornal no CD. Antes, resolvi ligar para a empresa para ver se eles faziam este recolhimento. Eles disseram que sim, para os funcionários deles registrados, já que se trata de uma GUIA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL mas, pra que eles precisariam fazer este recolhimento na prestação de um serviço?

Também não entendi. Liguei para o departamento de finanças da Leste 1, a diretoria de ensino que cobre a minha escola e me explicaram: EU teria que ir no banco, fazer o pagamento - recolhimento da GPS - 11% (no valor de R$ 138,00) em nome da empresa que iria prestar o serviço, depois iria na empresa, faria o serviço bancando apenas R$ 1.122,00, entregaria a guia recolhida no valor de 138,00 e eles iriam me passar uma nota de R$ 1.260,00 o valor total. Entendeu? Nem eu muito bem. Explico

138,00 - GPS - paga antes do serviço prestado, no banco
1.122,00 - pago à empresa por um serviço que vale
1.260,00 - valor que deveria constar na nota fiscal

é como se fôssemos comprar um carro na loja que vale 10.000,00 mas aí eu faria assim: ia no banco, recolhia o (suposto) imposto do carro, entregava a guia recolhida no banco + o cheque da diferença, talvez de R$ 8.900,00

confuso? muito. caralho, o imposto já está imbutido nos bagulhos, nos produtos que consumimos, compramos, ou não? para que esta complicação toda? pagar um imposto antes de pagar um serviço?

eu digo: burrocracia estatal.

resumindo a história. as 15:30hs da tarde estava (estou) nas mãos com um cheque de 1.260,00 que não vale nada. precisaria de um de 138,00, outro de 1.122,00, ir ao banco, pagar a GPS - recolher -, ir na copiadora com 1.122,00 + 138,00 recolhidos, pedir para executarem um serviço que vale 1.260,00, fazer o pagamento com 1.122,00 em cheque, entregar a guia recolhida de 138,00 e exigir uma nota de 1.260,00.

parece piada não?

ah, outro detalhe: o cheque que tenho em mãos, no valor total (1.260,00) não vale nada. precisaria de dois, com os outros valores quebrados que eu já falei. e teria que conseguir, em vinte minutos a assinatura das duas pessoas que assinam o cheque. elas estão em ermelino matarazo. Eu, no Ipiranga.

Você acha que deu?

Resumindo: depois de horas, dias, semanas de trabalho, meses de trabalho em cima de um jornal, por conta de uma burrocracia excessivamente estúpida e complexa, de pessoas que não trabalham direito e que me entregaram um cheque aos 45 minutos do segundo tempo para eu gastar, não teremos o jornal da escola.

Não teremos o jornal.

E os 1.260,00 que demorou quatro meses para chegar (enviei em 12 de julho, foi depositado em 14 de novembro), que eu tinha um mês para gastar e me passaram o cheque na data limite deste um mês, hoje, 14 de dezembro, as 14hs da tarde, será devolvido. E já me informaram que, quando se devolve uma verba, eles não aprovam nenhum outro projeto.

Caramba: eles tem uma estrutura administrativa enferrujada e, pra variar, os alunos são penalizados.

Isso é a Escola Pública no Brasil.
Que merda.

Rodrigo Ciríaco

P.S.: O texto está longo e confuso mas, eu precisava desabafar, como num diário. Escrever para tentar entender um pouco o que aconteceu. Passei vinte minutos aqui escrevendo e entendi. Só não entendo por que estas coisas ainda acontecem...

quinta-feira, dezembro 13, 2007

conto - DIÁLOGO IMPOSSÍVEL

- Licença pra falar, senhor?
- Licença concedida professor.
- Sabe o que é governador, temos dezesseis alunos na escola da quinta a oitava série que não estão alfabetizados. Mais uns outros que...
- E daí? Seja breve professor.
- Bom, nós não gostaríamos que eles fossem aprovados.
- Como assim? Que conspiração é esta? Quem não gostaria que eles fossem aprovados professor?
- Todo mundo da escola senhor: pais, alunos, professores...
- Absurdo! Isso está me cheirando a golpe. Estão querendo contrariar a lei professor?
- Não senhor.
- Nós temos um problema aqui professor?
- Não senhor governador.
- Então está tudo certo, tudo resolvido. Estão automaticamente aprovados.
- Mas senhor...
- E eu posso saber por que eles não foram alfabetizados?
- Situação difícil governador, o senhor sabe: muitos alunos em sala, muito trabalho; pouca gente séria, comprometida, pouca paciência. Além disso, não fomos preparados para alfabetizar alunos na quinta, sétima série e...
- Incompetência. Vai botar a culpa no governo agora professor?
- Não senhor.
- Então aprova logo esses moleque e pronto, depois a gente vê como resolve. Dispensado.
- Permissão para falar, senhor?
- Ai meu cace... Permissão concedida Aspira. Um minuto por favor.
- Nós já fizemos isso no ano passado senhor.
- Isso o quê?
- Deixar para o ano seguinte a alfabetização deste alunos.
- E por que porra não fizeram isso este ano, eu posso saber professor?
- Não autorizaram fazer uma sala de alfabetização com apenas dezesseis alunos senhor. O mínimo permitido em lei são vinte.
- Isso mesmo.
- Então...
- Então vocês não tiveram a capacidade de achar mais quatro analfabetos nessa merda de escola pra fechar uma turma?
- Ainda bem que não senhor. Além do mais, poderíamos ter formado uma turma com dezesseis, com dez, com cinco que fosse. Não importa o número, o importante seria alfabetizá-los, não?
- Insubordinado! Professor, o senhor é um fanfarrão! Quer contrariar a lei? Quer cometer uma improbidade? O senhor quer perder seu cargo, quer ser processado?
- Não senhor.
- Então pede pra sair. Pede pra sair!
- Eu quero sair senhor!
- Ah, muito fácil. Vai, vai embora. Vê se trabalha melhor e não me traga suas frustrações aqui, no meu gabinete.
- Sim senhor, senhor.
- Moleque!

Poesia da Dinha - inédito

SOBRE CÃES E CADEADOS

As portas
Da cidade
Tem zilhões
De cadeados
- um para cada madame
E seus cãezinhos de enfeite.

Porta de casa é um só.
Para os seus representantes.


*******************


AO MAIS-NOVO CAÍDO

Asseguro.
Com certeza pensou no filho.
no menino que seria
o dos teus olhos
pra sempre.
tua mãe também
quando ouviu teu nome
e tiros
pensou no menino dos olhos
dela.
com certeza
lembrou do batismo
bebê no colinho
abandonando, desde cedo,
o pai.

Asseguro.
Pensou na vida
inteira
pela frente
que era sua e queríamos
que vivesse


pensou, talvez, em mim


eu que sangro todo dia
sua vida e sua história
e que endereço a você
meus versos de guerra e de glória
e divido com meus anjos
essa responsabilidade:
garantir tua existência
avançar em tua idade
roubada
até que se prove
o contrário
e você possa

descansar

em paz.

Festa de Entrega do Prêmio Cooperifa - Don Quijote de la Perifa

Fotos: Rodrigo Ciríaco e Tânia Canhadas
O Prêmio - Don Quijote de la Perifa

Zé Batidão ontem - lotado

GOG presenteando a Negona - Rose Musa

Dois guerreiros de fé, pessoas integras que eu admiro pra caralho - GOG passando o prêmio para Sérgio Vaz.

Irmãos de Batalha - Robson Canto, Jairo e Yo!

Sérgio Vaz fazendo a entrega para Gaspar - Z'África Brasil (Eu não vi nada, Não sei de nada)

Parte da família

Ontem foi um dia de muita, muita alegria para mim.
A ficha demorou tanto pra cair que quando eu vi, hoje, era quase duas da tarde e eu não tinha comido nada. Nem tomado café, nada.
Explico: quis aproveitar o Axé, a energia de ontem para finalizar os contos do meu livro. Está 85% pronto. O ano novo está aí e, espero, trarei novidades.
E foi bonito demais ontem.
O que é este prêmio, o Don Quijote de la Perifa, el hombre de lata.
Que coisa linda.
Não parei de olhar, admirar. Algo maravilhoso. Eu achando que devia premiar toda a Cooperifa e recebo um prêmio desse. Sinceramente, nem sei se mereço.
Mas já que ganhei, é meu, não vou recusar.
Ou melhor, é nosso: este prêmio é da Tânia. Por me aturar, por me apoiar, por me encher o saco; por caminhar comigo, lado a lado, as vezes na frente, me puxando, dando uma força quando penso em desistir;
Vai para o Marcelino: com toda a sua generosidade, toda a sua amizade. Obrigado cabra e...
Vai para a Dinha: grande amiga, recém mamãe de Sara. Ano que vem promete pra essa nêga, estou tendo o privilégio de olhar o seu próximo filho, em mãos e digo: está do caralho. Gostei muito nêga, muito mesmo.
E eu não sei mais o que dizer. Apenas que estou feliz.
Valeu família Cooperifa. Valeu Robson e Neide Canto. Vocês são meus irmãos-guerreiros. Valeu família, Valeu.
Rodrigo

terça-feira, dezembro 11, 2007

Uh Cooperifa, Uh Cooperifa!


Amanhã é dia da entrega do 3º Prêmio Cooperifa.

Esse ano tem um sabor mais do que especial para mim. Foram várias conquistas. Só para citar algumas delas: publicação de um poema na Antologia "SARAU", das edições Dulcinéia Catadora. Aqui perdi o meu cabaço. Projeto "A Sedução da Palavra", na minha escola, na qual desenvolvi com meus alunos um jornal, o "Fique de Olho!", além do projeto Literatura (é) Possível, na qual levei vários escritores para um bate-papo na minha quebrada - o ano que vem tem mais. Publicação de um poema na revista da Semana de Arte Moderna. Publicação de um conto na Antologia "MOSCAS", organizada pelo Marcelino Freire. Seleção de um poema para a revista GRAP - Graffiti e Poesia, na qual será feita uma arte sobre o poema (revista que contará com a presença mais do que ilustre de Dinha, Allan da Rosa, Michel da Silva, Akins, Elizandra e outros ilustres guerreiros de pegada e caminhada que eu muito, muito admiro). Publicação de um conto na revista "Não Funciona", dos Maloqueiros. Publicação de um conto no jornal "Menos Escritores", da oficina de narrativas, do B_arco. Caralho, esse ano fiz coisa pra porra. E agora ser agraciado pelo prêmio Dom Quixote de la Perifa. Sinceramente, acho que eu é que deveria premiar todo mundo que me ajudou nesta caminhada. Valeu mesmo.


Rodrigo

LETÍCIA NÃO QUER MERENDAR

Letícia não quer a merenda. Letícia nunca comeu a merenda mas ouviu dizer que é ruim, que é sempre a mesma coisa; que não presta. Letícia vê o que alguns alunos fazem com a merenda: dão duas colheradas e deixam no canto, seguram nas extremidades e fazem catapulta. Raspam o fundo do prato com a colher de plástico e: - Tia, tem mais? Os merendeiros. Letícia diz pras amigas que não é merendeira. Ela inclusive comprou esta semana um tênis novo. Vai ganhar da tia uma calça. Já encomendou um celular para a mãe. Tem nome e marca de carro: um V8. Letícia espera que o seu V8 não demore, ela tem medo. Não pode ser rejeitada. Odeia ser zoada. Ser apenas mais uma do povo. Comer a merenda, como todos. O Zé povinho. Letícia não se importa de não comer, as modelos não são todas magras? Quem dera tivesse bulimia, suas amigas acham bonito. Dizem que é doença de rico. Letícia sabe que devia, mas não tomou o café da matina. Não tomou porque não tinha. Assim como não almoçou, porque de ontem só sobraram as panelas vazias. Apesar que isso ela não reconhecia. A última coisa que Letícia me disse antes de desmaiar sobre a minha mesa foi: FOME.

domingo, dezembro 09, 2007

"Deixe dizer-lhe, com o risco de parecer ridículo, que o verdadeiro revolucionário está guiado por grandes sentimentos de Amor." (Guevara)

domingo, dezembro 02, 2007

CLASSIFICADOS

Procura-se homens fortes discretos e corajosos que saibam manejar isqueiro gasolina quentinhas envenenadas ou grossos porretes de madeira ferro alumínio. Não é necessário experiência. Requisita-se apenas não ter dó pena falso sentimentalismo ou remorso das crianças mendigos e velhos abandonados que habitam as pontes-senzalas e mocós infectos de ratos pulgas e baratas localizados no Centro. Comparecer nas Segundas Quartas ou Sextas desmunidos de Identidade Curriculum e Carteira nos principais Bancos Lojas de Comércio Agências de Segurança e Imobiliárias para realizar Seleção Entrevista Exame psicotécnico e Dinâmica de grupo. Muitas Vagas. Serviço permanente. Paga-se bem.

sábado, dezembro 01, 2007

conto - MIOLO MOLE FRITO

Meu sonho é matar meu padrasto. Essa noite eu consigo. Vou ferver o óleo e de madrugada jogar dentro do seu ouvido. Enquanto ele estiver com o sono pesado, dormindo que nem um menino.

Não será para ele não sofrer não, eu quero que ele sofra. Muito. Mas tem que ser na trairagem pra ele não me machucar mais, não mexer mais comigo. Nem com a minha irmã. Alias, eu avisei: faz o que quiser no meu corpo dolorido. Me bota pra lavar roupa, limpar a casa, sentar no seu colinho. Antes eu chorava, esperneava, mas agora... Agora eu desligo. Só que deixa a Beatriz de lado. Deixa a Beatriz.

Se encostar num fio...

Podia cuspir na minha cara, chupar o meu peitinho. Esfregar a minha testa contra a porta do armário, apertar o meu pescoço – como fez tantas vezes - mas, ela não. Ela ainda é ingênua. Não carrega esse riso triste, esse sangue pisado. O chumbo vazio.

Valeu o aviso?

Tudo bem. Quando eu estiver esquentando o óleo, vou lembrar bem da temperatura do seu cinto. A maneira que ele queimava o meu lombo. A agulha de crochê e a ameaça que você fez de enfiar dentro do meu olho. Espetar a minha retina como o dedo fura o bolo, lembra? Lembra Antônio? Eu lembro. A cicatriz ainda tá no meu rosto. Naquele dia você mandou eu sofrer e não soltar nem um pio. Quietinha. Nem um pio.

Esse é meu sonho professor. Esta noite eu realizo. Apagar a bituca do cigarro na bochecha de Beatriz só fez eu ter certeza do meu pedido. Sabia que carne queimada é fedido? Por isso que não sai da minha cabeça o tssssssssss do óleo escorrendo na orelha, fritando o lóbulo, amolecendo os tímpanos. Quem sabe assim ele escuta os gritos que eu não pude dar quando vinha pra cima com o corpo pesado, exalando cachaça. Quem sabe assim a minha mãe acorda e percebe o que fez com a gente. Comigo.

Sei que o senhor pode estar assustado prôfi mas, não se preocupe. Quando for corrigir essa Redação já estará tudo resolvido. Eu, com o pé na estrada. E o miolo mole, frito.