terça-feira, abril 20, 2010

ESTAMOS PERDENDO!

direto. sem firulas. hoje eu tô com o saco grande. bem cheio. vou dizer tudo. estou de saco cheio de aluno que chega na sala de aula, em plena quinta, sexta, oitava série, e não tira a mochila das costas. o caderno da mochila. e eu tenho que falar todos os dias: "fulano, abre o caderno. ciclano, faça por favor a lição. beltrano, aqui não é festa, é escola, temos um objetivo, um trabalho a fazer aqui." estou de saco cheio dos pais que não acompanham a vida escolar do aluno. não pegam, uma vez sequer na semana, no mês, o caderno do filho, filha, pra saber o que andam (ou não) fazendo na escola. não questionam o aprendizado do aluno. o ensino do professor. estou de saco mais cheio ainda dos pais - principalmente O pai - que abandonam os alunos, seus filhos. fazem e jogam no mundo. não estão nem aí pra tudo. estou de saco cheio de aluno conversando, me ignorando em sala. fingindo não estar nem aí. pior, rindo da minha cara. rindo da minha raiva. rindo por eu estar de saco cheio e não poder rir. estou de saco cheio de dar aula para salas com trinta e cinco alunos, em cinquenta minutos, tendo pelo menos dez que não conseguem ler e fazer uma conexão com uma frase. entender um problema. e se eu sento com um, eu deixo os outros 09 que tem dificuldade sozinhos. e os outros vinte e cinco que sabem alguma coisa também largados. porque eu acho que é muito aluno por sala, pra pouco professor e pouco tempo. estou de saco cheio de não dar conta do recado. estou de saco cheio de não conseguir ensinar direito, de não conseguir dialogar profundamente com os meus estudantes. de ter que rebaixar, sempre mais e mais e mais o nível de exigência que tenho deles. estou de saco cheio de não ter um suporte pedagógico, de ver que a escola não tem planejamento, organização, execução e avaliação. de ter que admitir que eu não sei o que fazer para mudar, melhorar, e não ter ninguém para conversar sobre isso. apoiar. discutir. dialogar. ter que me virar sozinho. ou fazer como a maior parte faz: ignorar. estou de saco cheio de me sentir incomodado, de achar que sou o único que se importa com essa porcaria que chamam de educação e que dizem que é a coisa mais importante para o futuro e que é a base pra tudo e que tem um jornalista de merda chamado Gilberto Dimenstein que vive dizendo baboseiras mas não entende como funciona na prática a realidade de uma escola pública. e estou de saco cheio de soluções mirabolantes, de todo mundo ter uma opinião formada sobre o que fazer mas na verdade ninguém faz nada. merda nenhuma. tô de saco cheio de lembrar algumas vezes quando estou em sala que eu estou me matando, ficando esgotado, querendo chegar em casa pra desmaiar na cama quando saio do trabalho, não lendo o suficiente, não escrevendo o suficiente, não vivendo o suficiente e tudo isso por míseros R$ 7,58 (sete reais e cinquenta e oito centavos) a hora de trabalho. e por quase dez anos, sem reajuste. sem aumento. estou de saco cheio de ter que aguentar pela ideologia, porque o que eu faço é bonito, e precisa de ter mais gente assim no mínimo igual ou melhor do que eu. tudo isso eu estou de saco cheio porque eu vivo tudo isso que estou relatando quase todos os dias. é batata, é comum, é cotidiano e ordinário. e eu estou ficando cansado. de ver meus sonhos não realizados. de ver projetos virarem poeira. de ver futuros como o meu e da molecada escorrendo pelo ralo e de não ver perspectiva nenhuma de melhora. porque tá todo mundo é preocupado com o umbigo, com o comodismo, com o que eu estou escrevendo no blog. mas ninguém está preocupado em resolver, em dialogar, em trabalhar que seja junto comigo. querem é todo mundo ficar coçando o umbigo. pra não dizer o saco. que eu já disse muitas vezes. e isso enche o saco! e eu só quero terminar dizendo que de tanto estar de saco cheio de tudo, uma hora eu vou chutar o pau do barraco. afinal, na guerra da educação, estamos perdendo já faz tempo. e não é o saco. até porque ele anda bem cheio.

5 comentários:

Suzana Gutierrez disse...

E não tem jeito enquanto não compreendermos que não existe esta 'coisa' chamada "Educação", como coisa feita que nos oprime ou mobiliza. Que Educação é uma construção diária das ações e das omissões de todos, com maior ou menor poder.

abraço!

Unknown disse...

Caro, Rodrigo.
Não é à toa que você é um (bom) escritor. Você consegue escrever exatamente aquilo que outros (eu) pensam, sentem, mas não conseguem, com essa mesma agudez e contundência, traduzir em palavras, em escrita.
Infelizmente o que a move, pelo que pude perceber nessa postagem, é um profundo desânimo e cansaço perante o que está dado na educação pública. Compartilho das mesmas sensações: de abandono, de descaso, de mesquinhez, de ausência, de falta de senso e de emepenho, falta de tudo na escola. É claro que existem momentos bons, únicos, aos quais nos agarramos para tentar acreditar que há ainda luz no fim do túnel. Mas eles são poucos, escassos.
Recentemente um grupo religioso foi à escola. Trata-se abertamente de um recrutamento bastante invasivo e escuso. Já questionei e discuti outras vezes sobre a permissão da escola para esse tipo de abordagem. O ensino é laico. Tudo o que entra na escola, indireta ou diretamente tem o aval dela, passou (ou deveria passar) pelo seu crivo. Mas as pessoas envolvidas com a educação (a maioria) não está nem aí. Preferem discutir sobre amenidades, reclamar e não fazer nada (nem a greve) para mudar.
Por essa e por outras, Rodrigo, que eu também faço parte do seu coro: ando bem de saco cheio.

Um forte abraço. Mei.

AnaCris (Nika) disse...

Triste ler isso, Rodrigo. Meu cunhado e minha irmã , com vinte anos de carreira, largaram mão. fazem o que dá e quando dá, mas já não se esfolam mais. Uma pena, puta profissionais. Educadores, antes de qualquer coisa. Será que o caminho está fora da escola e não mais nela? Pra gente pensar e, fazer acontecer...
Mas antes a gente ainda vai chorar muito. Ah, se vai!

madoka disse...

Rodrigo,
vontade de te ´dar colo´ sabia? porque eu sei o que vc tá passando na pele. Já passei por isso também.
Força e é o trabalho de formiguinha mesmo que a gente faz, só assim pra seguir em frente de cabeça erguida.
Um abraço forte
madoka

Rose Cruz e Késsia Santos disse...

Oi Rodrigo...
E ai como esta essa sua luta pela educação hein...
Pois é infelizmente temos que nos deparar todos os dias com coisas que nos deixam absolutamente contrariados, voce na educação e eu no jornalismo, mas o importante é não deixarmos de ser quem realmente somos, e lutar sempre para obter o melhor. E principalmente conseguir dormir em paz, sabendo que por menos q tenhamos feito naquele dia, já foi alguma coisa.

Até breve...