quarta-feira, dezembro 20, 2006

JUSTIÇA ainda que tardia

I

Não Daniele, não bastava
ser acusada de infanticídio
da próprio filha.
Era preciso mais.
Como a Príamo de Tróia
Que recebeu um presente de grego
Mas antes, teve durante certo tempo
O corpo de seu filho Heitor negado,
À você o enterro de sua filha
também foi objetado.

Foi chamada de monstro,
Acusada de assassina
A imprensa fez o seu digníssimo papel
Datena na TV,
Close, provocação para a pose,
Execração ao vivo.

Foi-lhe negada o direito à defesa
Foi-lhe negada o crédito, o grito
Foi-lhe negada a justiça,
Foi-lhe negada o enterro do próprio filho.

De injusta opressora
Se tornou um justo oprimido
“joga o bicho da mamadeira pra cá”
diziam outras presas
confundindo papéis antes definidos.

Foi espancada, surrada,
sua mandíbula quebrada,
seu ouvido, com meia caneta enfiada
por súbita misericórdia, de enfiá-la inteira
foi poupada, mas não o seu
castigo.

Pós 30 e sete dias
O laudo decreta
A matéria confirma:
“MAMADEIRA DE BEBÊ MORTO
NÃO TINHA COCAÍNA.”

E junto com a notícia
Ouça agora fatos antigos, ocorridos
Mas antes parcialmente escondidos.
A pequena filha, um ano e poucos dias
uma doença com diagnóstico não definido.
O hospital, cotidiano
A tratava com 04, 05 remédios por dia
1825 por ano
inclusive um, com pó branco
em sua boca e na mamadeira
por COCAÍNA confundidos.

Antes de quase mártir na cadeia
Daniele no hospital em que a atendia
Já havia sofrido.
Onde deveria receber ajuda pública, alheia
Foi estuprada, violentada,
Por um aluno quintanista de medicina
Aproveitando-se do infortúnio de sua filha
E a sua permanente dependência dos clínicos.

Denúncia no DP registrada
Exame de corpo delito confirmava
O estupro cometido.
O quintanista não foi punido!
Apenas Daniele e sua filha
Que passaram a ser desprezadas nos hospitais
E não mais receber atendimento digno.

37 dias presa
o laudo confirma o engano cometido
Daniele foi solta
Finalmente pode ver a pequena cova, cheia
Que contrastava com o seu grande coração, vazio.

Ela espera justiça,
Saber se o óbito da filha
Foi omissão de socorro
Pelas muitas horas não atendidas
Ou se foi morte natural
Um pedido de deus atendido.


II

A inocência de Daniele
Não teve a mesma repercussão
Que mereceu o suposto
Infanticídio.
Poucos jornais recontaram
a sua história.
Não vi ninguém pedir desculpas
Pelo mal entendido.

Nem o Estado, responsável pelas omissões de socorro,
Diariamente nos hospitais, milhares
Não são socorridos.
Nem a polícia, responsável pela prisão,
Diariamente presos são maltratados e agredidos.
Nem as presas, responsáveis pela agressão,
Tão oprimidas quanto ela,
Engrenagens nas mãos de verdadeiros bandidos.
Nem a TV, responsável pela execração,
Pela matéria, julga condena, profere a sentença
Sem que todas as partes sejam ouvidos.
Nem o quintanista, estuprador
Que usou camisinha, não pôde ser reconhecido
e sente-se ainda, agora
Protegido e prevenido.

Quer saber, de que adianta desculpas,
Não é Daniele.
Nenhuma redimirá a sua dor, de mãe,
De mulher, ofendida e violentada,
Acusada, julgada e condenada,
Calada,
Sem culpa, sem direito ao grito.
Nenhuma trará a Victória de volta,
Sorridente, sem dores,
Uma vida sem sofrimento vivido.

De que adianta desculpas Daniele,
Nenhuma redimirá a sua dor.
Você precisa de Justiça!

JUSTIÇA!
Ainda que tardia.

3 comentários:

Sacolinha disse...

Boa rapaz, muito boa.

r.c. disse...

é a dor sacola, é a dor,
que não passa e nem pede sangue,
mas justiça.

DMaua disse...

Um salve.

É isso aí Rodrigo. Nosso país é feito disso: injustiças. Injustiças históricas, injustiças cotidianas... mas aqui é conhecido como o "país da alegria", q às vezes vejo como falsidade. A melhor desculpa nessa história poderia ser a JUSTIÇA.