quinta-feira, janeiro 15, 2009

NOITE DOS ANCESTRAIS

o que mais é possível para ser feito dentro de um Sarau? melhor ainda, o que mais é possível ser feito dentro do sarau da cooperifa? lembrando vagamente, já temos o Ajoelhaço, o Poesia no Ar, Prêmio, entre outros pequenos eventos que transformam e enriquecem quartafeiramente o cotidiano do sarau.

mas num desses lances irados de zagueiro, na qual São Pedro deu uma entrada dura em São Paulo, o mundo desabou na cidade. para se ter idéia, a caminho do Sarau, percorrendo mais de 50 (isso mesmo, cinquenta) quilômetros saindo do Cangaíba, atravessando as duas marginais - Tietê e Pinheiros - eu peguei chuva forte, de ponta a ponta. não conseguia ultrapassar os sessenta quilômetros por hora, na pista expressa. várias poças d'água fizeram o carro, por várias vezes, quase aquaplanar. e eu ali, tenso, com um olho no peixe (a pista) e outro no gato (o rio), que parecia não parar mais de crescer.

para ter idéia do que foi o estrago da entrada do Pedrão em Sampa, quando voltei para casa, as duas da madruga, estava praticamente um cenário de guerra aqui no Cambuci/Ipiranga: vários desvios, lama, árvores derrubadas; bombeiros e funcionários da CET trabalhando.

tudo isso para dar uma idéia do que foi ontem a noite de Sampa, e para falar do Sarau. porque quando eu subi a ladeira da Piraporinha, estava tudo escuro. tudo. só não estava breu por conta da lua, teimosa, que por inveja do sol insistia em iluminar a noite. cheguei ao sarau, estacionei o carro e fui.

tudo apagado. luz de velas. estávamos sem energ.... ops! sem energia não. quem estava lá estava com uma energia da porra. além da vela, dava para ver as almas brilhando, os sorrisos iluminando os espaço, abraços abrindo brilhos, brechas de luz, além dos flashs das máquinas, é claro.

e para quem achou que não ia ter sarau, ele começou assim, a luz de velas. um sarau de velas, sem microfone, sem tecnologia. como faziam nossos ancestrais africanos, indígenas: uma fogueira no centro, olhares atentos ao redor e o silêncio, em respeito a palavra. o silêncio.

ontem foi o sarau mais silencioso da qual eu já participei, em qualquer lugar. o mais. ouvia-se nitidamente o gotejar da chuva sobre a laje, o vento zunindo entre as folhas das árvores, e a palavra declamada dos poetas. só. ontem, o silêncio foi uma prece, foi canto, foi pura poesia.

ontem foi o sarau da noite de gaza. muito axé e muita luta para a família palestina. muito desejo de vivência, de resistência. muitos votos de paz, acrescidos de justiça, é claro.

com certeza, o sarau de ontem está entre os mais belos que eu já participei.

o que mais a cooperifa pode fazer?

não sei. mas Sérgião, com certeza o "sarau de velas" tem que estar dentro dos eventos oficiais da cooperifa. talvez como ontem, na abertura do ano do sarau. para mim, coincidências não existem. e o cara lá de cima já tinha deixado marcado na sua ocupada agenda mais este evento. e com certeza ele participou. senti várias vezes ele ali, declamando, dizendo: estou presente.

2 comentários:

Estêvão Campos - DF disse...

Muito loko, Rodrigo. Vibração total o sarau... dá pra sentir de longe. A presença do fogo é surrealmente mágica. Raíz pura.

Anônimo disse...

Rodrigo,

seu texto chegou em mim como um abraço.
Essas noites duram para sempre.

Tamo junto e misturado.

Sérgio Vaz