quarta-feira, novembro 26, 2008

SONHO REAL*

para Bruno*

Quando crescer, quero ser poeta.

Vou viajar por mares ressecados e outros nunca antes navegados, sem jamais esquecer da quebrada. Sem nunca borrar a história das minhas origens África. Sem nunca apagar da memória os meus antepassados.

Quando crescer, quero ser poeta.

Ainda que me façam acreditar que este sonho não é possível. Ainda que me digam eu não tenho chance, que eu tenho que aprender a ler e a escrever melhor, por mais que estude numa escola que não coloca isso ao meu alcance. Ainda que digam que é besteira, que poeta no Brasil passa fome, que cultura não dá dinheiro, que o melhor é ser traficante, criminoso, bicheiro. Não interessa.

Quando crescer, quero ser poeta.

Vou metralhar com as minhas palavras os apresentadores de TV que dizem que só tem violência na minha quebrada. Vou exterminar com as minhas palavras as gargantas opressoras destes invasores que divulgam a sua versão de periferia violenta, triste e desacreditada. Vou eliminar com a tinta preta no papel branco todas as telas alienadas, as drogas, as armas e as bocas de fumo; recriar com lápis de cera e giz de cores os jardins, parques, amigos e brinquedos existentes nos meus sonhos enquanto durmo. Vou estraçalhar, com respeito e tolerância todas as estatísticas, inclusive aquelas que dizem que jovem negro, pobre e da periferia não tem vez na vida. Não crescem. São árvores sem direito a raiz, água, sol, fruto e cultivo.

Quando crescer, quero ser poeta.

Já conheço Sérgio Vaz. Já conheci Marcelino Freire, Elizandra de Souza, Akins Kinte; Allan da Rosa, Dinha e Sacolinha. Já conheci Alessandro Buzo, Carlos Galdino. Solando Trindade, Manuel Bandeira, Vinicius de Morais, Carlos Drummond de Andrade. Conheço o professor Rodrigo Ciríaco. Quem mais eu preciso conhecer para me convencer? Ninguém, talvez apenas a mim mesmo. Acreditar que eu posso. Acreditar que eu sou capaz. Acreditar que eu sou possível.

Vou mostrar que na quebrada se vive na alegria da paz, apesar dos dias de Guerra. Vou desbicar minhas raízes ancestrais, mostrar a todos a nossa capoeira, nossa shigombela; vou bibóizear o rap, reescrever os funks, acordar o samba de raiz. Pois na quebrada onde eu moro tem origem, mais sangue correndo na veia do que no chão, como se diz. Minha quebrada está viva. E eu preciso cantar. Eu preciso declamar, eu preciso falar. Eu preciso escrever poesia.

Por isso, quando crescer, quero ser poeta.

Não importa que não seja um poeta de profissão. Serei por convicção. Não importa o quanto eu tenha que batalhar e que muitos digam que isso tudo é e foi em vão. Não importa que eu tenha sonhos, que eu acredite que o mundo possa ser melhor, que eu lute para que o mundo seja melhor mas que eu nunca eu o veja finalizado e construído. Não vou cair nesta ilusão, a construção se faz no caminho. Não importa que no final eu me sinta estranho, um pouco abandonado e solitário, achando que o mundo não se muda sozinho, que é preciso que as pessoas queiram mais, que é preciso que as pessoas batalhem mais. Não importa. Vou prosseguir entoando este canto, este sino.

Quando crescer, quero ser poeta.

Acho que já estou aprendendo.

3 comentários:

igualdade disse...

muito obrigado mesmo professor, muito obrigado por sua ajuda; pela sua força de vontade, pelo seu carater; pela sua amizade; pelo seu acreditar em mim, pelo seu companherismo. Que mesmo em mundo cheio de guerras e violencias existem pessoas como voce que mostram e que querem fazer um mundo melhor que querem fazer um mundo que brilhe ou entao que as pessoas desse meio desse mundo vivam esse brilho vivam essa alegria. por que sonhar sempre é preciso acreditar nos seus sonhos é mais importante ainda....
que Deus te abençoe ainda mais e que sonhos seus que estao sendo lutados para serem realizados se torne realidade e olhe "faça seus sonhos se tornarem realidade mas nao faça a realidade se tornar um sonho". Obrigado mesmo

Robson Canto disse...

Mano se eu pudesse já tava lá removendo os escombros!
E eu não sumi nada pára de me dimafar no meu blogger seu puto!!!!!!!!!!!!!!!!

Canto

Anônimo disse...

Fala Ciríaco, belíssimo texto, meu chapa!!!!
É o seguinte, fui convidado para uma espécie de corrente dos oito desejos dos blogs, e faço o meu convite a você. É BACANA!!! Dá uma espiada no meu labirinto e veja lá os passos dessa divertida brincadeira!!!
Abraço,
Marcelo Maluf