sexta-feira, maio 29, 2009

PRATOS LIMPOS - conto


Cuspi sim! Cuspi hoje, cuspi ontem, cuspiria de novo. Com gosto. Puxando lá do fundo do pescoço. A vingança não é um prato que se come frio? Por que que eu não posso botar um tempero? Pois bem. Cuspi sim.

Tá fazendo por que, essa cara de nojo? Cara feia pra mim é fome. Você quer um pouco? Onde já se viu. Me julgar é fácil. Onde é que você tava quando pegaram a mangueirinha e mijaram no rodapé da sala. Nas quatro paredes, de fora a fora. Dentro do cesto de lixo. Quando tiveram a coragem de cagar no banheiro e limpar com o dedo na porta. Arrastar no azulejo, na torneira, na maçaneta. Hã? Onde é que você tava quando essa cambada pegou tudo: colher, prato, caneca, jogaram tudo, tudo dentro da privada. Deram descarga. E o pior: cagaram por isso. Isso mesmo, jogaram dentro da privada e cagaram por cima? Você acha que tá certo? Cagar no prato que comeu?

Não é história, não. Isso é escola. Por isso que pra você é fácil me recriminar. Não sabe o que a gente passa. Não é você que tem que limpá todo dia essa desgraça. E olha, pra fazê coisa errada eles são criativo. Já tive que enfiar o meu braço em cada buraco fedido que nem te conto. Ia estragar o seu almoço. Fora as banalidade, as obra de arte que deixam todo dia no pátio: molho na escada. Arroz e feijão esmagado no chão. Purê de batata no teto. É um desperdício que não tem tamanho.

Agora, uma coisa é certa: não é só aluno que faz esse chiqueiro não. Professor é um bichinho porco também. Não é capaz de tirar o copinho de café de cima da mesa. Jogar o guardanapo do lanche no lixo. O farelo do pão. Não faz nada. Vão lá, sujam e, “tudo bem, deixa aí. Tem quem limpa”. Quem eles pensa que eu sô? Empregada? Na sala de aula a mesma situação. Como é que vão servir de exemplo pra essa molecada? Agora o dia que eu vi aquela cena no banheiro das professora, eu não acreditei. Uma coisa assim, parecia uma fralda de tão grande, grossa, jogada. Aberta, que nem uma rosa. Desabrochando na nossa cara, cheia de sangue. Você acha? Deixar o modess daquele jeito na tampa da privada? E o pior: ainda nem tava seco. Quem quer ver um útero daquele meu Deus?

Rrrrrrraaaaiic. Puff! Nossa, esse foi osso. O que moço? Não, não acho que essa é a melhor solução, não. Sabe o que eu acho que deveria fazer? Deveria era ter pego o desgraçado, a desgraçada, que fizeram essas porcalhada, porque descobrir não é difícil, sempre tem uma parede que tem ouvido, uma porta que não quer ficar calada. Tinha era que ter descoberto quem fez e botado pra mostrar a cara. Chamar o pai, mãe, sei lá, o responsável; se fosse o professor, de maior, com ele mesmo deixar acertado: vai ficar um mês na labuta, colaborando no ordenado. Varrendo o chão, lavando o banheiro. Enfiando a mão na bosta. Ajudando a gente a organizar esse pardieiro. Me diga: posso ou não exigir esse respeito? Isso é ou não é educação? Obrigar o sujeito a reparar um erro que comete, mostrar que tem que ser direito, tudo tem limite. Tô certa ou não? Mas ninguém faz nada. Ninguém corre, ninguém investiga. Fizeram como fazem sempre: nada. Ignoraram. Foram totalmente indiferentes. Pior: coniventes. Mostraram que todos, todos, sem exceção, tão cagando e andando pra tudo. Pra gente.

Pois bem. Eu, por enquanto, só to cuspindo.

quarta-feira, maio 27, 2009

INDICAÇÃO DE FILME


Ontem assisti ao documentário "Simonal - Ninguém sabe o duro que dei".

Já conhecia um pouco do Simonal. Um pouco através do seu trabalho, algumas músicas muito boas que ele tem, cantada com swing, personalidade e um carisma irresistível. Da outra parte, da época da faculdade, quando soube que ele fora acusado injustamente de ser um colaborar da Ditadura Militar brasileira, na sua face mais dura: o governo Médici.

Nunca pesquisei muito sobre o assunto, mas ontem fui assistir o filme que, aliás, eu recomendo.

Wilson Simonal foi um dos mais completos artistas brasileiros. Da década de 60, quiçá dizer um dos mais até hoje. O cara tinha atributos que poucos ainda tem: talento, carisma, personalidade. Fora pobre, era negro. Um guerreiro. Dominava o palco - e diga-se de passagem, o público - como ninguém.

Mas cometeu um deslize. E em tempos como os nossos, eles são imperdoáveis.

Num lance pessoal e financeiro com um contador, utilizou-se da violência para resolver a parada. E como violência era o sobrenome do governo Médici, Simona acabou ficando muito próximo dos homens da repressão. Por vacilo, ingenuidade, oportunismo. Valeu-se dos homens e da estrutura da repressão. Mas não era um deles.

Resultado: se fudeu.

A direita TFP (Tradição, Família e Propriedade) o abandonou porque não admitia um negrão daquele, botando a banca como bancava, comandando a massa como comandava, chegando a ameaçar em sucesso figurinhas como o Tremendão e outros;

A esquerda, com o seu patrulhamento ideológico, em partes compreensível pelo momento, mas não menos intolerante e cruel, deixou à merce, jogando bosta no ventilador pra feder, principalmente por considerar o Simona uma figura de destaque do que era o Capitalismo - o que não deixa de ser uma verdade.

Mas Wilson Simonal era um artista fenomenal. Na minha opinião, o melhor artista de palco que já vi. O que o camarada fazia com a platéia era absurdo. Não merecia o que fizeram com ele: um rótulo eterno. O ostracismo, a indiferença. O julgamento sumário, sem defesa. O total esquecimento.

Mas isso é ser artista no Brasil. Hoje lhe jogam flores. Amanhã, ovos podres.

Por isso que eu não faço questão de agradar ninguém.

Não deixe de ver o filme.

R.C.

segunda-feira, maio 25, 2009

EM OBRAS

não, não estou em crise. não agora. a crise parece ser permanente. essa opção de remar contra a maré, de fazer tipo de "advogado do diabo" pra tudo sempre deixa a gente um pouco em crise. meio pertubado. sei lá. não sei.

fato é que eu tô cansado de fazer "big brother" da minha vida. falar dos problemas pessoais, profissionais, enfim. lado bom é o desabafo. botar pra fora, a língua na janela e tal. mas isso também cansa. esse papo de jogar pedra te faz uma bela vidraça. e ultimamente eu tô precisando levantar a minha casa. sem grandes prejuízos.

por isso a ausência. por isso o silêncio. repensar prioridades, repensar atitudes. repensar a vida. se não há nada muito útil pra dizer, uma grande reflexão, pra quê falar? faz diferença pra alguém ficar contando sobre os meus problemas, sobre o meu cotidiano? não sei.

o silêncio, este sim deveria fazer alguma diferença. trazer alguma preocupação. mas o silêncio não incomoda a ninguém. o silêncio está mudo. é fácil ignorá-lo. poucas ligações no meu fone, poucas mensagens na caixa postal. quase ninguém perguntando "E aê, cê tá firmeza?". mas assim seguimos. agora. talvez sempre.

na escola, continuamos na mesma. atuando como "guardadores de gente". há muito tempo deixamos de ser educadores, professores, ou qualquer nomenclatura das dores que alguém queira auto-acrescentar-se-a-si. hoje por exemplo teve reunião. os responsáveis daqueles que deveriam vir, não vieram. cena corriqueira mas que me chama a atenção: não vieram porque não sabiam ou não vieram porque não se interessam?

em sala, a mesma ladainha: cagar regra pros pais, falar da obrigação. eles fazendo cara de que "o inferno são os outros" e os professores, a mesma coisa. o mesmo discurso: o problema está na família. claro. é mais fácil culpar os outros. difícil é encarar a nossa mediocridade dentro da escola, a nossa incompetência e incapacidade para resolver os nossos problemas e ficar culpando o governo, a sociedade, a família. todos tem culpa, claro. mas estou aprendendo a expiar um pouco da minha. pelo menos se eu conseguir, faz alguma diferença.

três coisas que aconteceram hoje e me deram um pouquinho mais de força para dar uma guinada na minha vida, em breve:

1) ver o portão da escola, aberto, escancarado, alunos entrando e saindo como se estivessem num clube, num shopping, em qualquer lugar, menos na escola. detalhe: um inspetor de alunos, responsável pelo molho de chaves, encostado numa parede, ao lado do portão, fingindo que nada estava acontecendo;

2) o cesto de lixo da sala de aula, na primeira aula da tarde da 5ª série C, cheio de mijo. imagine como é bom para um aluno estudar numa escola dessa, o ânimo e disposição que ele terá. isso mostrou outras coisas também a) ninguém havia passado na sala para limpá-la, depois da aula do período da manhã (fato corriqueiro) e b) o respeito que os alunos possuem pelo espaço. na semana passada pratos e talheres foram jogados dentro da privada do banheiro das meninas na hora do intervalo e, detalhe: cagaram em cima!

e 3) soube que uma jovem, de vinte e oito anos, teve um AVC (derrame) na sexta-feira. está internada, cabeça raspada, risco de vida.

a vida é tão rara, passa tão depressa, e a gente esquentando a cachola por coisas que, de repente, nem valem a pena.

em desconstrução,

r.c.

sexta-feira, maio 22, 2009

APENAS JUSTIFICANDO

Por enquanto, muito assunto. A vida em ebulição
Sofrimento, angústia, paz e rebelião - da alma
Por enquanto, muitas coisas, voltas e meias
Pijamas, insônia e solidão
Por enquanto, nádegas a declarar.

O silêncio diz tudo. O silêncio não é só ausência de sons,
palavras. O silêncio é o fim. O início, de tudo.

segunda-feira, maio 18, 2009

EU QUERO É BOTAR MEU BLOCO NA RUA

Há quem diga que eu dormi de touca
Que eu perdi a boca Que eu fugi da briga
Que eu cai do galho e que não vi saída
Que eu morri de medo quando o pau quebrou

Há quem diga que eu não sei de nada
Que eu não sou de nada e não peço desculpas
Que eu não tenho culpa Mas que eu dei bobeira
E que Durango Kid quase me pegou

Eu quero é botar meu bloco na rua
Brincar, botar pra gemer
Eu quero é botar meu bloco na rua
Ginga pra dar e vender

Eu por mim queria isso e aquilo
Um quilo mais daquilo Um grilo menos nisso
É disso que eu preciso Ou não é nada disso
Eu quero é todo mundo nesse carnaval

Eu quero é botar meu bloco na rua
Brincar, botar pra gemer
Eu quero é botar meu bloco na rua
Ginga pra dar e vender

(Sérgio Sampaio)

http://www.youtube.com/watch?v=rsiAN__ii7E

sábado, maio 09, 2009

CARTÃO POSTAL BOMBA!

O barato foi lôco, o som ritmado e o DVD da melhor qualidade. De verdade, um dos melhores DVDs de música que eu vi nos últimos tempos. E da periferia. Trabalho profissa. Não devendo nada pra ninguém.

Este é o trampo do irmão, meu e das quebradas do Brasil, Genival de Oliveira Gonçalves, o G.O.G. Adquiri o meu exemplar diretamente das mãos do mano, na segunda de 04 de maio, na Cooperifa. Já esperava algo bom. Mas o GOG gosta de surpreender a gente.

Música da melhor qualidade, com participações mais que especiais de Sérgio Vaz, Dona Sebastiana, Lenine, Lindomar 3L, Rapadura, Maria Rita, entre outras pessoas fantásticas. Mas o lôco mesmo é som irado, a musicalidade da banda MPB-Black, que acompanha o GOG. Profissionais do mais fino gabarito.

Este DVD é um show e uma escola. Para a quebrada, para os grupos de rap; pra todo mundo que está na caminhada e quer uma referência de trabalho digno e bem sucedido.

Eu destaco as músicas Dia a Dia da Periferia, Mais uma Estória, Quando o Pai se Vai, Brasil com P, Assassinos Sociais, A Ponte (Eu e Lenine), Fogo no Pavio, O Amor Venceu a Guerra e Foi Somente (Onda). Ou seja, quase o DVD inteiro.

Pra quem quiser saber mais, comprar o DVD, baixar músicas, acompanhar o Genival, acessa aí um sítio de responsa:

http://gograpnacional.com.br/

E mais não digo. Vou botar de novo o DVD no toca-disco.

Renato Vital, Crônica (A Família), Gog e eu, na Cooperifa

OS MESQUITEIROS

Grupo Teatral "Os Mesquiteiros": (da esquerda pra direita) Thais, Gabi, Jessica, Monica, Carol, Gabi, Pri, Gleice, Debora, Bárbara, Deborah, Glaice, Van, Gabi, Marcelli, Atanilo, Felipe, Galego, Bruna e eu - Escola Estadual Jornalista Francisco Mesquita.

"Nóis sem nóis não é nóis"

quinta-feira, maio 07, 2009

MELHOR IMPOSSÍVEL (?)

Não sei. Sei que tirando algumas coisas ligadas ao coração, que encontra-se em fase de reconstrução, esta semana esta sendo muito, muito boa. Como há tempos eu não tinha em minha vida. Pois bem, eu acho que o cara lá de cima mandou uma tempestade braba tempos atrás só para agora tacar a bonança. É, dizem que Ele escreve certo por linhas tortas. Vai ver que é isso.

O barato mais que lôco começou na segunda. Cinema na Laje. Na tela, os Panteras Negras. Numa roda de conversa, GOG, Sérgio Vaz, Rose Dorea, Prof. Lu, Brau Mendonça, Jairo, Cocão, Preto Will, Casulo, Renato Vital, De Lourdes, Du Toledo, Crônica (A Família), Márcio Batista, B Valente e outros guerreiros e guerreiras, da mais fina qualidade, batendo um papo-sério numa noite fria de SEGUNDA-FEIRA, até as onze e meia da noite. Periferia, família, humildade. União, discurso, organicidade. Teoria e prática. Poesia, política. Etecetera.

Noite mágica, conversa afiada. Meus pensamentos tão trocando uma idéia até agora.

Terça-feira, outro dia especial. Fui com os meus alunos no Centro Cultural Banco do Brasil, no centrão. Passeio lôco, mais de trinta alunos, rodando pelo Centro da cidade e, maior paz, tranquilidade, nenhum xabú. Muitos alunos não conheciam o coração da cidade, então, quebramos o protocolo e fomos dar um rolê pela Praça do Patriarca, Viaduto do Chá, Vale do Anhangabaú e Teatro Municipal antes de começar a incursão pelo CCBB propriamente dito. Lá dentro, uma exposição sobre contos de fadas que vale a pena ser visitada. Na volta, só sorrisos, lanches e muita alegria.

Quarta-feira, meu aniversário. Recebi mensagens, telefonemas, bolo em família. União que há muito tempo não acontecia. Fiquei feliz. Principalmente com um presente que não tem valor: as felicitações dadas pelos meus alunos das Quintas séries. Aqueles mesmo que eu me descabelo vez em quando, grito, esperneio, converso, olho nos olhos, chamo de canto e por aí vai. Ganhei um cartão tão bunitinho de uma aluna que os meus olhos mareiam até agora quando lembro.

E depois, a Cooperifa. O santuário da poesia. O Robson Canto (que dessa vez não deu cano) lembrou do meu aniversário em público. O Dill, leu um poema do Ze da Luz, e ofereceu para mim e para a Dona Edith. O Marcelino (!) disse que foi lá, entre outras coisas, pra bebericar o meu aniversário. O que eu queria mais? O parabéns, comemorado ao lado do meu irmão Jairo. Tudo lindo. Festa inteligente.

E hoje? Putz, hoje foi foda. Quase que o coração não guenta. Dos olhos não escorreram lágrimas porque já chorei muito por estes dias que se passaram. A carga de lágrimas está enchendo, aguardando as próximas ventanias. Mas, o dia bonito, para não se esquecer. Só pra ter idéia, até hoje eu nunca havia ganhado uma festa surpresa. Sempre quis ter, pra ver como é o sentimento, o susto, como seria a minha reação. E por falta de uma, foram duas.

Primeiro, foi de manhã. Os alunos da minha sala de coordenação. Preparam o bolo, a coxinha, o pão com presunto e queijo, o mousse de maracujá, o brigadeiro, o beijinho. Quer mais? Que tal um cd com fotos e música, exibido em um telão, com direito a choro e declarações? Pois foi assim. E eu não chorei. Mas teve aluna que chorou. Até os marmanjões, máscara de valentões encheram os olhos de lágrimas. Foi bonito. Saber que algumas pessoas reconhecem o trabalho. Principalmente, das pessoas mais importantes: os meus alunos.

E ainda depois, a tarde, OUTRA festa surpresa. A turma do teatro. Confesso que na turma da manhã, eu não sabia, mas estava desconfiado de alguma coisa. Agora, a tarde, depois de uma festa surpresa de manhã, outra festa? Me pegaram de jeito. Um jab no queixo. E eu quase fui pra lona. De felicidade. Mais salgadinho, refrigerante, bolacha e bolo. Caras e dedos lambuzados. E eu com um sorriso no peito, quase não me aguentando. Só desejando que esse dia não acabe. Que as horas não passem. Que eu não acabe na frente de um computador escrevendo os meus relatos em casa. Sozinho.

Mas estou bem. E queria dizer, obrigado. A quem desejou parabéns, a quem esqueceu. A quem me quer bem, a quem não me quer. Para todos, desejo tudo em dobro. É assim que é. E valeu.

Com o coração em chamas e a alma em êxtase,

Ciríaco.

P.S.: logo mais no final de semana eu posto as fotos destes dias...

domingo, maio 03, 2009

VIRADO (conto)

Uma porra! Essa Virada Cultural é uma merda. Pura violência, pura sacanagem com a gente. Por quê? Porque a gente num é gente, a gente não é nada, entendeu? A gente é o lixo, o excremento da sociedade. A gente é pra ficar aí, jogado, sujo, sem ter lugar pra tomar banho, sem ter o que comer, sem ter onde cagar nem dormir. A gente é pra ficar invisível. A gente num devia nem existir na face das ruas, porque a gente incomoda. A gente é o avesso da sociedade, do sucesso, do consumo. Tá ligado? Tudo bem, uma hora a gente aceita, se acostuma com isso. Faz o possível pra não aparecer, se pede alguma coisa faz com vergonha como se pedir fosse errado, como se estivesse roubando. Tem que agüentar bacana tirar nóis de pinguço, cachaceiro e outros pano. De dia, só humilhação: empurra-empurra, correria, gente gritando. É nóis aqui largado, sem vida, sem amigo, sem trabalho, sem dinheiro, sem nada. Fazendo um biquinho aqui, catando umas latinha ali, uma correria acolá, esmolando. A gente sobrevivendo. E de tarde vem a noite: o breu, a solidão, o apagar do sol e o abandono. A fome e o frio. Rasgando a barriga, cortando o sono. As vezes, só muita cachaça na cabeça, senão não tem jeito. É foda. A gente sofre pra caralho nessas madruga aqui, meu irmão. Você não tem noção. Mas então, um belo dia, vem essa porra da Virada. Que merda é essa Virada, cara? Esse mar de gente zanzando no nosso espaço. Show pra lá e pra cá. Barulho, treta, pegação. Sodoma e gomorra, pura orgia. E gente bêbada. Gente zuada, travando as quatro pata. Pode olhar, só gente lôca, alucinada. A mais pura degradação do ser humano. Tá aqui. O pior do ser humano tá aqui. E não tô falando da gente. É um que bebe, é um que fuma, é outro que fode, outro que cheira. E assim vai, chapando até o osso. Até perder a mão, perder o juízo. Encostar em alguma porta de loja, de bar, e cair. Apagar e dormir. Coma. Overdose. Tipo aquele filha-da-puta ali. O que caiu do meu lado. Do meu lado, é mole? Começou a vomitar, o viado. Golfar. Jogado no chão e golfando. Não saía nada, só uma água preta, tipo de fossa. O cara mal, zoado. Você acha que alguém socorreu? Que nada. Pode morrer alguém aqui no meio que ninguém faz nada. Passavam ainda é com uma tiração, dando risada. “Ê, é pra bebê, caí, levanta, não é pra bebê, caí e fica, não.” E pega sapato, dá chute na barriga, pisão na cara. O mano lá, sem reação. Só chamando o Hugo, malzão. O filha-da-puta do meu lado. Tive que pegar meu papelão, minha sacola e sair fora. Ia acabar sobrando pra mim. Isso que é foda. Não agüento, essa putaria. Ninguém respeita o sono dos justos, meu irmão. Ninguém. Não basta no breu dessas madrugada, um monte de morador de rua que é morto com facada, paulada; paralelepípedo na cabeça, vem essa porra de Virada. Ninguém dorme. Uns playboy forgado que vem, grita na cabeça, joga água, cerveja, vinho na nossa cara e some. Querem pega nossas coisas, bota fogo. Tudo em nome da diversão. Diversão pra quem, caralho? Cês acham que tem o direito de vir aqui, tocar esse puteiro, acorda nóis, ficar se fingindo de nosso amigo enquanto tá bêbado, chamando, encostando, abraçando, dizendo que a gente não precisa só de pão, tem que aproveitar a cultura, que a vida não é tão dura e depois vão embora, mostrando pra gente a porta da rua? Deixando pra gente só os vômito, as parede com cheiro de mijo e essas montanha de lixo? Vai pro inferno, porra. Virada Cultural o caralho. Pra nóis essa porra é tudo uma merda. Pura politicagem, lavagem de dinheiro. Sacanagem. A vida segue, e hoje esses corno que tão me abraçando, tudo querendo dançar comigo, amanhã vão passar aqui e fingir que nem me viram. Fingindo que eu nunca existi. Vão pra casa, repousar no gostoso, dormir no quentinho, e a gente continua aqui. Fudido. Rezando pro prefeito acabar com essa bosta de evento e usar melhor o dinheiro público quando for pensar em investir.

sábado, maio 02, 2009

LUTO - MORRE AUGUSTO BOAL


Eram 18:10 quando eu vi esta notícia. E ela caiu como uma bomba no meu colo. Ainda não explodiu. Vai demorar um pouco para digerir.

Augusto Boal morreu.

Augusto Boal era uma das pessoas mais fantásticas desse país. Seja na categoria artista, educador, dramaturgo ou ser humano. Tivesse nascido em qualquer outro lugar lá fora seria notoriamente reconhecido, escutado, importado. Só não ficou realmente conhecido e valorizado no Brasil porque nós vivemos num país de merda.

Foi diretor do famoso Teatro de Arena, em São Paulo. Dirigiu e escreveu, em parceria com Gianfrancesco Guarnieri (outra lenda) Arena conta Tiradentes e Arena conta Zumbi, entre outras. Foi preso no período militar, ameaçado e teve que viver no exílio. Trabalhou com Caetano, Chico, Bethânia e outros artistas numa época em que eles ainda diziam algo pra gente. Boal viajou pelo país, conheceu a gente que brota no chão seco, que vive da terra sem ser dono dela e que sobrevive bravamente na guerra que foi instalada nos subúrbios e periferias do Brasil. Era amigo pessoal de Paulo Freire, Zé Renato, Oduvaldo Vianna Filho e Plínio Marcos.

Seu principal trabalho, o "Teatro do Oprimido", é (re)conhecido em mais de 70 países. Tive a felicidade de estudar o Teatro do Oprimido durante uns três anos. Fiz trabalho na faculdade, fiz oficinas, apresentei algumas peças. Uso as técnicas do Teatro do Oprimido na turma de teatro que comecei na escola há quase um mês. Tenho 07 livros do Augusto Boal na minha estante. É um dos autores que eu mais tenho livros. É um dos autores que eu mais li. Seu trabalho me transformou profundamente. Muito do que eu sou, da melhor parte de mim, devo a ele.

Tive o prazer de conhecê-lo pessoalmente no ano retrasado. O revi no ano passado. Estava um pouco debilitado, mas atuante.

Foi-se aos 78 anos. Insuficiência respiratória. Brigava contra uma leucemia. Até o último momento não deixou de trabalhar, não deixou de atender a quem quisesse saber - de dentro ou de fora do país - informações sobre o Teatro do Oprimido. Acompanhava projetos desenvolvidos no Brasil inteiro de perto.
Tinha 78 anos. "E é tão estranho. Os bons morrem jovens."

Adeus, Boal. Descanse em Paz. A gente continua por aqui. A luta, no luto.

Rodrigo Ciríaco


Augusto Boal, criador do Teatro do Oprimido, morre aos 78 anos no Rio

São Paulo - O dramaturgo e diretor de teatro Augusto Boal morreu na madrugada deste sábado, aos 78 anos, de insuficiência respiratória, no Hospital Samaritano, no bairro do Botafogo, Rio. Ele sofria de leucemia e estava internado desde o dia 28 de abril. O local e o horário do enterro não foram divulgados.

O trabalho do carioca Boal, que também era ensaísta e teórico do teatro, ganhou destaque nos anos 1960 e 1970, quando esteve à frente do Teatro de Arena de São Paulo e criou o Teatro do Oprimido, pelo qual foi internacionalmente reconhecido por aliar arte dramática à ação social.

Boal chegou a se formar em Química pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) em 1950, mas viajou em seguida para os Estados Unidos, onde estudou artes cênicas na Universidade de Columbia. De volta ao Brasil, sua primeira peça como diretor do Arena foi "Ratos e Homens", de John Steinbeck, que lhe rendeu o prêmio de revelação da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte).

Dirigiu ainda, entre outras peças, "Eles Não Usam Black-Tie", de Gianfrancesco Guarnieri, e "Chapetuba Futebol Clube", de Oduvaldo Vianna Filho. Foi o diretor do espetáculo "Opinião", com Zé Ketti, João do Vale e Nara Leão, que passou para a história como um ato de resistência ao golpe militar de 1964.

sexta-feira, maio 01, 2009

O POETA MANDOU CHAMAR: TODO MUNDO PRA LAJE! - PANTERAS NEGRAS

Bobby Seale e Huey Newton

Cinema na laje é um espaço criado pela COOPERIFA e que acontece quinzenalmente às segundas-feiras para exibições de documentários e filmes alternativos de todas as partes do Brasil e do mundo, exibidos gratuitamente para a comunidade. Também criado principalmente para dar luz ao cinema produzido pelos jovens da região, e levar cidadania através da sétima arte. O cinema Paradiso da periferia também conta com um lanterninha vestido a caráter para dar um charme especial no projeto. A Entrada é franca. A Pipoca é grátis. E a lua sincera..

DIA 03 DE MAIO 20HS30
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Laje do Zé batidão
Rua Bartolomeu dos Santos, 797 Chácara Santana
Zona Sul-SP
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"Todo poder para o povo. O partido dos Panteras negras e além"
Sinopse: Documentário que retrata experiência organizativa e de luta do Partido dos Panteras Negras na década de 60. Inicia com com o movimento de não-violência de Martin Luther King, de integração do negro ao modo de vida norte-americano. Por seu caráter reformista não garantiu as transformações que eliminassem o racismo.

Por causa das limitações do movimento pacifista, surge o partido dos Panteras Negras, o qual pregava a necessidade da população pobre (negros, índios, latinos...) se armar para enfrentar a polícia racista e a opressão do estado capitalista. Aqui veremos a vitalidade deste partido e a reação que despertou no governo americano, o que o encarou como "ameaça à segurança interna".

Diferente do filme, o documentário de 1997 foi concebido após as revoltas negras de Los Angeles, ocorridas em 1992, quando a impunidade da violência policial sobre o povo negro gerou quatro dias de levante massivo, com mais de 7 mil imóveis incendiados e 53 mortos. Enquanto a TV anunciava os estragos de mais de um bilhão de dólares, o documentarista Lee Lew-Lee decidiu se perguntar qual foi o verdadeiro dano histórico que provocou aquela explosão. O resultado é o resgate audiovisual de uma experiência profundamente consistente de organização e luta negra.
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Direção: Lee Lew-Lee
Duração: 60 minutos
Legendado
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*em caso de chuva o filme será exibido no bar

ELIANE BRUM

Minha amiga Eliane Brum, jornalista, pessoa humana(!), ética, voraz e sensível, está com uma nova coluna semanal no sítio da revista Época, e convida a todos para fazerem a leitura dos seus textos, comentários, críticas.

A primeira coluna chamada "Sobreviventes" está no link abaixo:


Eliane, além de ter recebido vários prêmios nacionais e internacionais, é autora de dois excelentes livros, que trazem uma espécie de mescla de contos-reportagens: A vida que ninguém vê e Olho da Rua. Se você não leu, adquira já o seu.

De verdade. Não faço rasgação de seda a toa. Gosto muito de Eliane e, perdoe-me, mais ainda de seus textos. Fazem-me lembrar, e muito, da Clarice (Lispector). Não por uma semelhança de estilo literário. Mas pelo efeito que o textos de ambas provocam na minha alma.


Não deixe de ler.

R.C.

DESABAFO

Já havia botado na minha cabeça que não falaria no blog de assuntos pessoais. Na verdade, todos os assuntos abordados aqui são muito pessoais. Mas eu não mais falaria daqueles assuntos do coração, que envolvem coisas como cumplicidade, entrega, confiança; respeito, segurança e amor. Falo do estar com o outro.

Mas eu preciso tocar neste assunto. Ainda que seja pela última vez. Ainda que seja um desabafo. Pois não estou mais com uma pessoa que eu amo. O seu nome é Tânia. E uma coisa que a incomodava, segundo me disse, é que só me referia a ela aqui neste espaço quando brigávamos. Quando queria externar um sentimento negativo referente ao nosso romance.

Talvez eu tenha feito isso. Talvez não. Não sei. Nesse momento estou com o coração fragmentado por conta do fim de um relacionamento amoroso de cinco anos, por conta de alguns problemas pessoais na família, por vários problemas - questões e pressões - referente a minha vida profissional. Tudo é muito confuso, vago e cheio de incertezas.

A única coisa certa e que eu gostaria de deixar claro é que eu Te Amo, Tânia. Eu ainda gosto muito de você. E acho uma pena, uma profunda tristeza não estarmos mais juntos.

E prometo não tocar mais no seu nome em vão - ainda que de forma vaga - neste blog. Seja para fazer alguma "referência negativa", seja para fazer uma declaração de amor. É como eu lhe disse: Eu Te Amo. Sou feliz por você existir e ser a pessoa que é. Com todas as imperfeições, qualidades e defeitos. E quero que seja feliz. Não importa como. Ainda que seja longe de mim.

Não se preocupe. Não vou mais lhe aborrecer.

R.C.

SARAU!

Uma coisa que eu penso que as vezes cansa dentro da educação é o que eu chamo de "ciclo do eterno retorno". O que é? Resumidamente, é assim: educar é difícil. Muito. Há um desgaste muito grande de energia mental, física, psíquica, principalmente nos primeiros anos, nos primeiros contatos com a turma. Os alunos testam você, a sua capacidade intelectual, a sua condição de liderança dentro da sala de aula, de mediador de conflito, a sua paciência. Eles não o conhecem, você não os conhece. Durante um bom tempo isso irá gerar conflitos, atritos; gritos, desgaste, perda de paciência, cansaço, desânimo e vontade de desistir.


Depois de um tempo, principalmente com a mesma turma, as coisas vão mudando, melhorando, aos poucos. Eles passam a conhecê-lo, você os conhece. Sabe as dificuldades e qualidades de cada um, sabe o jeito, a postura, a atitude de cada um frente o dia-a-dia na sala de aula, frente as diferentes situações. Você aprende como lidar melhor com cada um, a maneira como deve falar com fulano, como pode abordar o ciclano. Até onde pode ir e exigir de todos, mas também individualmente. E aí começa o barato da coisa. É aí onde fica melhor.


Mas ter passado por tudo isso - um processo que dura, no mínimo uns três anos, na minha opinião e que depende se você está com a mesma turma, não garante que você não vai ter que passar pelos conflitos, gritos, desgaste, perda de paciência, cansaço, desânimo e vontade de desistir. Pois é só pegar uma turma nova que tudo vai (re)surgir: os desafios, as dificuldades. Pois sempre haverá novas crianças e adolescentes para educar. Este é o "ciclo do eterno retorno".


E ele é cansativo. Demais. Pois como eu disse, educar é difícil. Se é difícil para os pais com um, dois ou três filhos em casa - quer dizer, isso para os pais que se comprometem a educar os filhos, a maioria prefere abandoná-los a própria sorte, independente de cor, credo, religião ou classe social - imagine para um professor em condições totalmente adversas, pensando em estrutura, apoio pedagógico, preparação, formação e com turmas de trinta e cinco a quarenta alunos - quando não mais? É uma loucura, ou melhor, diria uma violência. Para ambas as partes.


Mas se o título da postagem é SARAU!, por que estou dizendo tudo isso? Pois pegar as turmas novas também tem uma coisa boa: ensinar o novo. Não que não seja possível ensinar para turmas já conhecidas, nada disso. Há sempre o que ensinar e há sempre o que aprender. Para ambos os lados do front. Mas, como eu disse, quando a turma é conhecida, os macetes, as técnicas, algo também já é conhecido. Há a possibilidade de surpreender - sempre! - mas vai ficando talvez mais raro. Mais difícil (mais desafio). E as turminhas novas talvez não. Há muito para se mostrar para elas. Principalmente depois de um tempo que você vai ficando mais apurado no seu trabalho, reparando os erros e fazendo um trabalho com mais qualidade. E isso foi legal esta semana, quando fiz o primeiro sarau com as minhas turmas de quinta série. Foi muito bacana, eles curtiram massa, decoraram os poemas, criaram cartazes e, fizemos leituras bem bacanas. O resultado vocês vêem nas fotos.



Pena que a qualidade não ficou boa pois eu tive que tirar com o meu celular - esqueci a máquina. Mas, tudo bem. Teremos outras oportunidades... Confira aí: