domingo, dezembro 20, 2009

AOS MESQUITEIROS

o comentário da minha amiga e parceira de luta nas trincheiras escolares, Mei Hua, foi tão bonito, que eu não poderia deixá-lo escondido apenas para quem acessa-se nas entranhas das postagens. então, publico-o aqui. obrigado, Mei. vou repassar também aos aluno e alunas. garanto que ficaram grato e felizes.

"Aos Mesquiteiros:

Ainda acredito que a educação pública tenha jeito. Acredito que o teatro, como arte, envolve uma parcela incomensurável de elementos que formam e educam sem resvalar para o “pedagogês”. Ainda acredito que existam pessoas que botem fé umas nas outras.

As crenças acima são verdadeiras, mas, devo confessar, sofrem ataques constantes dos reveses cotidianos. Ainda mais na esfera escolar, com suas instâncias burocratizadas, com sua enorme ausência do poder público, com sua complexidade de fatores negativos que quase sempre tomam o curso do fracasso, do desânimo ou da revolta.

No entanto, a peça fundamental dessa engrenagem chamada escola ainda é o aluno. Professores, coordenadores, diretores, funcionários e educadores não existiriam em suas funções se acaso não estivesse ali o aluno. E, apesar de presenciarmos repetidas vezes dentro das escolas o descaso quase generalizado – quando não uma atribuição de culpa por todos os problemas existentes – para com eles, alunos e alunas, há momentos em que somos realmente felizes enquanto educadores e seres humanos. Isso ocorre justamente quando há um encontro – geralmente único, especial – entre aqueles que deveriam ensinar e aqueles que deveriam aprender, mas numa via de mão dupla, ou seja, quando todos percebem que, para além das injustiças, do dinheiro, das agruras, das obediências curriculares, existe a possibilidade de enxergar o outro com “olhos livres” e, num ato de extrema coragem, entregar aquilo que nos é mais caro, mais precioso, como oferenda de boa fé ao outro.

Honrada. Foi exatamente assim que me senti ao assistir à peça De aqui de dentro da guerra, apresentada por vocês Mesquiteiros, sob a tutela do persistente e audacioso professor. Rodrigo Ciríaco. Honrada e de alma lavada por ver e sentir do que a rapaziada é capaz quando alguém resolve verdadeiramente acreditar e trabalhar duro com eles. Por que o que se vê ao assistir ao espetáculo se projeta para longe, ultrapassa as barreiras da escola e ocupa o espaço de outras dimensões que, por sua vez, afetam e determinam aquilo que adentra as instituições de ensino. Dialético e profundo, mas feito com uma simplicidade que dispensa elucubrações. Os meninos (ou melhor, menino e meninas) surpreendem e causam espanto, curiosidade. Incitam nos espectadores o riso nervoso ao interpretarem as cenas carregadas de ironia (presente nas falas dos textos contundentes). Encantam com seus relatos e tratam com suavidade e desenvoltura temas densos como abandono, descaso, morte.

E eu, que queria tanto assistí-los na escola, mas não pude, fui brindada com esses momentos mágicos em que realidade e ilusão se misturam, se condensam e viram outras possibilidades.

Obrigada.

Um caloroso abraço a todos(as).

Mei Hua."

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