domingo, abril 01, 2007

Lula, Lula. Acorda, tá na hora de ocupar a cadeira...

ELIANE CANTANHÊDE
Nunca antes neste país?
BRASÍLIA - O governo Lula cedeu aos sargentos controladores de vôo e abriu uma crise com brigadeiros, generais e almirantes. O tempo dirá se foi um bom negócio. A história costuma dizer que não. No meio do tiroteio entre o governo e os sublevados, quem foi atingido por uma bala certeira, e não necessariamente perdida, foi a Aeronáutica, que foi desmoralizada. O comandante Luiz Carlos Bueno foi atropelado pelas negociações dos ministros da Defesa, Waldir Pires, e do Trabalho, então Luiz Marinho, com os sargentos que fizeram operação-padrão em outubro, contrariando as leis militares e até a Constituição. Agora, o novo comandante, Juniti Saito, foi desautorizado pelo próprio presidente. Perdem Lula, Alencar, Pires, Dilma, Saito e toda a cadeia de comando militar, resvalando no descontrole e no sacolejo do Estado democrático. Ganham os controladores de vôo, que foram à guerra e venceram. Em vez de punidos, como quis Saito, foram brindados com as promessas de vantagens e de desmilitarização do setor. No dia 30 de março de 1964, Jango se reuniu com sargentos no Automóvel Clube sob aplausos do então consultor-geral da República, Waldir Pires. No dia 30 de março de 2007, Lula ditou do AeroLula a ordem para seu governo ceder aos sargentos de vôo, com apoio do ministro da Defesa, Waldir Pires -que depois sumiu. O país não é o mesmo, a democracia é uma realidade e não há nenhuma hipótese de golpes. Mas essas coisas deixam marcas profundas. Lula e seu governo não estão apenas demonstrando incompetência num apagão mais do que previsto; estão brincando com fogo. A foto dos militares esparramados pelo chão, com uniformes amarfanhados, em greve num setor vital e parando o país, é uma imagem terrível do governo Lula para a história.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0104200704.htm


ANÁLISE
Militares nunca engoliram Pires
IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O descaso do governo Lula com a gestão da crise aérea e a teoria sindicalista de relações de poder acabaram de colocar o Brasil frente ao maior impasse na área militar desde a redemocratização, em 1985.Houve crises anteriores. No governo Sarney, eram variadas -houve vazamento de planos para endurecimento do regime, em 87, e um quase-levante por melhores soldos no ano seguinte. Collor e Itamar tiveram relações difíceis, e mesmo o diplomático FHC teve de enfrentar uma revolta no generalato por mais verbas em 2000.Mas o ineditismo da crise atual reside no fato de que há uma quebra de hierarquia legitimada pelo poder civil. Não que alguém vislumbre idéias golpistas, cujas sombras sempre são exageradas; é a natureza da relação entre políticos e militares que está em jogo.O fundamento da instituição militar é o respeito pela hierarquia. Há intrigas, traições, grupos internos, como em qualquer agrupamento humano. Mas o edifício de uma Força militar é baseado na disciplina -com tudo de hipocrisia que isso possa implicar, e não está em questão na crise atual.Os militares nunca engoliram o ministro Waldir Pires, da Defesa. Nem tanto pelo passado antimilitar e esquerdista do ministro, mas pelo fato de ele ter tratado os controladores de vôo como "companheiros".Seu movimento inicial na crise, de abrir canais com os sargentos que controlam os vôos, acabou sendo desmontado aos poucos. A FAB endureceu progressivamente, seguindo o seu princípio da hierarquia.Como sempre, há abusos relatados. O Comando da Aeronáutica exagerou? Provavelmente. Mas é preciso ter em mente que, dada a estrutura precária do sistema de controle de vôo num ambiente militar, não havia outro caminho concebível para a FAB.Enquanto isso, o governo enrolou os envolvidos. Fez uma pantomima de desmilitarização, prometeu discutir aumentos e, principalmente, deixou os passageiros ao léu. Um sistema de gerenciamento civil ineficiente, baseado na Anac e Infraero, completou a equação junto a empresas despreparadas e gananciosas.Resultado: crise crônica com agudizações eventuais. E os controladores nem eram os principais artífices nos apagões anteriores, embora levassem a culpa sistematicamente.O problema é que anteontem a corda, esticada desde outubro do ano passado, estourou. Os controladores explicitaram de vez o poder que a estrutura lhes permite. Meia dúzia de sargentos podem parar o país.Sem opções ao ver o sistema aéreo entrar em colapso em 20 minutos na noite de sexta, o governo federal cedeu. Dobrou os joelhos e desautorizou o comandante da FAB, Juniti Saito. Como o presidente Lula está fora, a negociação foi tocada no melhor estilo chão-de-fábrica pelo ministro Paulo Bernardo.Humilhou Saito: além de vetar a ordem de prisão que ele pretendia aplicar aos amotinados, não permitiu que ele participasse das negociações. Saito pode até compor, ao estilo sindical do governo, mas o caminho natural seria entregar o cargo.Para piorar, o acordo que Bernardo costurou subverte a ordem militar, ao garantir que não haveria punições para uma situação de motim. O movimento pode incentivar a outros militares mal-pagos a fazer suas exigências. Militar não é sindicalista.O controle dos vôos deve ser civil? Há argumentos para o sim e o não. O que não dá é tentar resolver a coisa sob ameaça, com um documento rascunhado às pressas.E o governo não pode nem dizer que com isso evitou o caos. Ele já está aí, e o texto não dá garantia alguma de que os controladores não repetirão o movimento da sexta.Os sargentos têm seu ponto: são insubstituíveis no cenário atual. Os operadores da Defesa Aérea precisam de meses de treinamento para assumir as cadeiras dos colegas, para ficar na opção que Saito cogitou na sexta-feira. É receita pronta para novos acidentes.Lula, que se gaba de ter poderes fenomenais de negociação outorgados por anos de sindicalismo, terá que acalmar as Forças Armadas, provavelmente entregando a cabeça de Pires, mas é improvável que a situação na Aeronáutica se pacifique sem que os controladores sejam enquadrados. E, se isso acontecer, o país pode parar de novo. O nó é enorme.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0104200720.htm


Motim (Editorial da FOLHA)
Na crise que voltou a paralisar aeroportos, governo tinha obrigação de restaurar a cadeia de comando militar
A LENTIDÃO e a displicência do governo Lula perante a crise aérea terminaram por levá-la a um patamar inaudito. O motim que paralisou todos os aeroportos brasileiros na sexta, em atitude de aberta insubordinação militar, é a conseqüência da condução sindical empreendida pelo presidente da República desde o início do transtorno endêmico na aviação, há seis meses.Enquanto Lula seguia no seu confortável Airbus para Washington, os saguões dos aeroportos do país se apinhavam de gente, mais uma vez. Controladores militares simplesmente cruzaram os braços -são impedidos por lei de fazê-lo- e iniciaram uma greve de fome. "Reivindicavam" uma gratificação salarial e a suspensão dos remanejamentos de líderes da rebelião.O ministro Waldir Pires, a essas alturas o símbolo da incompetência governamental, reagiu com a vagareza de sempre. Em plena tempestade, prometeu enviar um relatório com os diagnósticos sobre a crise "em 10 ou 15 dias", acrescentando "no máximo". Para completar, por telefone o presidente Lula ordenou a seus ministros que cedessem à extorsão dos amotinados, desautorizando o comando da Aeronáutica, que se aprestava a punir os líderes da sublevação.Os ânimos dos controladores, registre-se, haviam sido previamente excitados com novas promessas, feitas pelo Executivo, de retirar o serviço da alçada militar. Os inconseqüentes sindicalistas que povoam o governo federal ainda não conseguiram entender o estrago que a sua atitude produz nas Forças Armadas, instituição cuja natureza está assentada na hierarquia.Ainda que o governo pense em cometer o erro de mudar de mãos o controle de vôo, transferindo-o para o âmbito civil, é um despropósito tomar uma decisão dessa gravidade sob ameaça. Sua obrigação imediata era restaurar a cadeia de comando militar. Até poderia ter acenado com contrapartidas materiais, mas precisaria ter erradicado a insubordinação e punido os infratores.Ao menos alguns contrapesos institucionais ao comportamento desastrado do Executivo nessa crise começam a funcionar. Agiu bem, e de acordo com a melhor tradição do Supremo Tribunal Federal, o ministro Celso de Mello ao determinar que a Câmara desarquive o pedido de criação da CPI sobre a crise aérea. Trata-se do primeiro passo para anular uma manobra da base governista e assegurar o direito da minoria.A aceleração da crise deverá levar a coalizão do governo a rever sua posição de confrontar o interesse público. Parece inevitável a instauração já nesta semana da CPI do tumulto aéreo.A crise também foi deflagrada, decerto, por razões estruturais. Nos últimos anos, explodiu a procura por transporte aéreo sem a devida ampliação da infra-estrutura; foi à falência a maior empresa de aviação do país.Mas nada disso torna tolerável um movimento que só não configura uma verdadeira quartelada porque, em vez de contestação político-ideológica, o que o define é a chantagem corporativa.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0104200701.htm


Veja a íntegra da nota da Aeronáutica
Em decorrência do acordo estabelecido na noite de 30 de março entre o Governo Federal e os controladores, o Comando da Aeronáutica propôs que os controladores passem a exercer, independentemente da gestão militar, o controle de tráfego aéreo de natureza civil, a partir da criação de um novo órgão, diretamente subordinado ao Ministério da Defesa. Os militares e civis que atuam em órgãos de controle de tráfego aéreo passarão à subordinação dessa nova organização.A Aeronáutica continuará com sua atribuição institucional de Controle do Espaço Aéreo, cabendo ao novo órgão a ser criado o Controle da Circulação Aérea Geral.O Comando da Aeronáutica compreende a posição assumida pelo Governo, em face da sensibilidade do assunto para os interesses do país, principalmente no tocante à garantia da tranqüilidade do público usuário de transporte aéreo.O Alto Comando da Aeronáutica, diante da gravidade da atitude adotada pelos controladores, destaca a importância da manutenção dos princípios basilares da hierarquia e da disciplina e reafirma a coesão da Força Aérea sob a autoridade de seu comandante.
Centro de Comunicação Social da Aeronáutica.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0104200706.htm


Na versão do Planalto, Lula não desautorizou comandante
KENNEDY ALENCAR VALDO CRUZ DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva não considera que tenha desautorizado o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, ao determinar que houvesse uma negociação do ministro Paulo Bernardo (Planejamento) com os controladores de vôo militares rebelados.Segundo a versão do Palácio do Planalto, Saito demonstrou ponderação na noite de sexta-feira e sai engrandecido do episódio na opinião do presidente.No início da noite de sexta, ainda de acordo com a versão do Planalto, quando a crise se agravou, Saito pretendia dar um ultimato aos controladores, alertando-os de que os que não retornassem ao trabalho seriam presos, mas concordou com avaliações feitas pelo gabinete de crise montado às pressas no sentido de que seria possível negociar uma revisão das punições.O próprio Saito teria, ainda na versão do Planalto, avaliado que, sem uma reserva de militares que pudesse realizar o trabalho dos amotinados, prender os controladores só geraria uma crise ainda maior.Quando Lula foi informado pelo chefe-de-gabinete, Gilberto Carvalho, por volta das 20h40 de sexta em pleno vôo para Washington, o presidente avaliou que a aplicação de uma "lei seca" (prender e punir os amotinados) poderia gerar uma paralisação dos aeroportos por dias. O presidente entendeu que ir para o confronto era "uma posição aventureira" e não de governo.Essa avaliação recebeu a aprovação de Saito, conforme relato de auxiliares diretos do presidente. Daí Lula ter dado a ordem de negociação dizendo que era preciso não haver "quebra de hierarquia".Na prática, no entanto, foi o que aconteceu [quebra de hierarquia].
Nota
Pela manhã, após surgirem rumores de que poderiam haver demissões na cúpula da Aeronáutica, Carvalho, falando em nome de Lula, telefonou para Saito e disse que ele saíra engrandecido do episódio por ter tido abertura para negociação.Saito também teve uma reunião, classificada de "tensa" e "difícil", com seus auxiliares para discutir a crise dos controladores.Ao final do encontro, ficou decidido que seriam divulgadas duas notas, uma interna e outra externa.A interna teria o objetivo de acalmar os ânimos da Força, já que a decisão de acatar as reivindicações dos grevistas, com a promessa de não haver punições, foi vista como uma quebra de hierarquia e gerou insatisfação em oficiais.Nas conversas telefônicas com assessores do presidente Lula, o comandante da Aeronáutica reconheceu que há setores descontentes da Força Aérea com as decisões do governo, mas disse que "não tinha fundamento" a informação de que oficiais do Alto Comando estariam demissionários.
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0104200709.htm


ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES
Para a frente, Brasil!*
VIVA! TROCARAM de termômetro e o doente melhorou. Usando uma nova metodologia, o IBGE descobriu que, em 2006, crescemos 3,7%, e não 2,9%. Muito bom, mas ainda continuamos a ocupar os últimos lugares na América Latina. As boas notícias sempre vêm acompanhadas de maus presságios. Neste caso, tivemos dois. O primeiro nos conclama para uma grande dose de cautela antes de comemorar a nova descoberta. Sim, porque nesse maior PIB teve grande peso a incorporação da Cofins nos preços dos bens e serviços e o crescimento dos gastos do governo. Melhor seria se o resultado tivesse decorrido de um aumento efetivo da produção de bens do setor privado e de um encolhimento da burocracia e das despesas públicas. Em 2006, o crescimento da indústria de transformação foi de apenas 1,6%. O segundo nos informa que a taxa de investimentos produtivos do Brasil em 2006 (16,8%) foi bem menor do que os 20% ou 21% que se alardeava até então, que, aliás, já eram insuficientes para o tamanho e as necessidades do país. A combinação dessas duas notícias mais preocupa do que alegra. Com investimentos reduzidos, pouco se pode esperar em termos de um crescimento sustentado e de uma grande geração de empregos para os próximos anos. Pior. Se o consumo continuar crescendo -o que é bom- por força de injeções assistencialistas de dinheiro público no bolso dos consumidores -o que é ruim-, vamos nos defrontar com um dilema conhecido e já vivido pelo Brasil: a oferta será insuficiente para atender a demanda. Todos sabem as conseqüências desse desequilíbrio: inflação, agiotagem, sonegação de produtos e outras práticas abomináveis, das quais, a duras penas, conseguimos nos livrar nos últimos dez anos. Nesse caso, o Banco Central terá todos os motivos para manter os juros altos ou, quem sabe, até elevá-los, dando um sonoro adeus ao desejado crescimento. Essa é a leitura que faço do novo termômetro. É como a criança raquítica -não havia como engordar- que, colocada em nova balança, alegra os pais por mostrar mais uns quilinhos. Porém, ao encontrar o médico, os pais ficam sabendo que a capacidade respiratória da criança está aquém de suas necessidades, o que comprometerá o seu crescimento futuro. Seria bom se, em lugar de festejar a troca de termômetros, estivéssemos comemorando a realização efetiva (e não promessas) de investimentos produtivos. Essa noticia será bem melhor do que a revelada pelo novo termômetro.
mailto:antonio.ermirio@antonioermirio.com.br

*Este texto entrou devido ao título "Para a frente, Brasil!". O título foi usado como uma forma ufanista de apoiar a seleção, enquanto o bicho pegava nos porões da Ditadura Militar. Mas que porcaria é esta de fazer um título deste neste momento hein, sr. Antonio Ermírio. Devido ao assunto tratado no texto, será que o sr. também apoiou a Ditadura Militar e o "Milagre Brasileiro"? Saudosista hein...

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