quinta-feira, agosto 19, 2010

CRÔNICA NÃO ANUNCIADA


O desperta/dor tocou cinco vezes. Na sexta, desliguei a função "soneca" e resolvi que não ia trabalhar. Não valia a pena. A começar pela condição física de meu corpo: moído. Parece que colocaram no liquidificador, bateram, coaram e depois despejaram na cama. Eu estava lá, todo dolorido. A garganta inflamada. E um sentimento de impotência e frustração que desde ontem me acompanham.

É duro trabalhar com pessoas. Se confrotar com pessoas. Acreditar em pessoas. Talvez eu preferisse trabalhar com máquinas. Linha de produção. E ver, a cada segundo, semana, mês ou dia o resultado do meu trabalho. Mas máquinas não falam. Máquinas só trabalham. Máquinas não pensam, não questionam, não vivem. Máquinas são máquinas demais. E eu sou afeiçoado demais as pessoas para não poder trabalhar com elas. Não estar com elas. Gosto de estar perto de gente. Gosto de crianças. Mas gostaria de ver resultado.

Não tenho grandes ambições, além de ver o meu mundo melhor.

Ha ha ha ha ha!

Na escola parecemos cachorros correndo atrás do próprio rabo. É impressionante como não conseguimos sair do lugar. Mudam-se as caras, mudam-se as pessoas, mudam-se os planos, planejamentos, propostas, projetos e nada muda. Estou cansado. Hoje estou cansado, e por isso resolvi ficar em casa. Combinados não funcionam. Acordos de nada valem. Quando ditos, são palavras perdidas no ar. Quando escritos, magoam, não deveríamos cobrar. E eu me pergunto: estamos todos acomodados? Estaria o mundo certo e eu errado ao ter a pretensão de consertá-lo?

Não tenho grandes pretensões, além de ver a minha escola melhor.

Ha ha ha ha ha! - (risada ensandecida)

Cinco toques, cinco campainhas. Cinco vezes o braço esticando pra fora da cama e calando o criado-mudo, que insistia em falar e, quer saber: não fui trabalhar. Pesei os prós e contras. Os R$ 7,58 que ganho por hora/aula. E vi que não trabalho por dinheiro. E se não trabalho por dinheiro, não vale a pena ir ao trabalho quando o sonho é questionado. Quando eu me deparo encostado no paredão, diante do olho escuro da escopeta. E por trás deles, pessoas esperando a minha próxima deixa. O meu próximo ataque, o meu próximo discurso. Para poderem dispararem:

"- Cara, desista.!"

"- Não vai dar certo."

"- Isso aqui vai te (con)sumir."

"- Eu já fui assim."

Ha ha ha ha ha é... hum... hum.

Nem no meu palco as coisas parecem caminhar. Falar tornou-se mais importante do que fazer. Fazer maldades tornou-se mais cotidiano do que sorrir. E longe da depressão me pegar, jogar no chão, derrubar, pisar sobre a minha cabeça, eu me questiono: pra quê? Vale a pena tanto esforço, pra quê? Se não consigo fazer do meu sonho o sonho de todos. Se não consigo tocar no sonho de todos e fazê-los meu. Se não sou suficientemente capaz de chamar, unir, agregar, somar. Pra quê?

Sei lá, oras bolas. Se soubesse a resposta o mundo tinha conserto.

Não tenho grandes desejos, apenas pagar a dívida do meu apartamento. Algum salário mínimo todo mês. Poder tocar meu violão no parque uma vez por semana e escrever um romance, estilo Guimarães Rosa. Um amor se pintar. A saúde se viver.

E Clarice L., pra me consolar nestes dias.

Um comentário:

Paula disse...

Que confortante saber que existem pessoas que sofrem das mesmas angústias, das mesmas frustações, das mesmas desilusões que eu!
Obrigado Rodrigo, por me lembrar que eu não sou a única no mundo com este problema...
Obrigada
Força!